terça-feira, 12 de junho de 2012

Malagueta

Uma das plantas, entre muitas outras que a gente cultivava em casa e que eram xodós do Chico do Ernesto, nosso pai, eram as pimentas. Ele cultivava cumari, dedo-de-moça e, principalmente, a malagueta. Conservava-as no vinagre, no azeite ou no álcool e dizia que cada tipo tinha um sabor diferente. Sempre esmagava três malaguetas verdes, no fundo do seu prato, antes de colocar a comida. Dos que vi comer mais pimenta que ele, só o Chico Apati, um húngaro que morava na avenida Média, perto do mercado público, que mastigava sete malaguetas vermelhas e depois sorvia um “mercedinho” (copo com 150 ml) de Jabiru, a cachaça preferida da época. O Chico sempre nos dizia: “O ardido da pimenta provém de uma substância denominada capsaicina e seu uso melhora o sabor, o aroma e a cor dos alimentos, além de ter um grande valor vitamínico (A e C)”. Saindo de casa num sábado à tarde, o Gordura pegou uma malagueta vermelhinha e tentava passar na minha boca. Corre daqui, se defende dali, se aproxima o Edmilson, moleque vizinho nosso, e pergunta: “Gordura, vai namorar hoje?”. “Vou. Vem cá que quero te mostrar um negócio”. E o Ed veio. Pimba, malagueta na boca dele. Foi uma correria só. O Ed berrando: “Pai”, e correndo pra dentro de casa; e nós dois voando até o bar do Chico. Escondi-me embaixo do balcão e o Gordura sumiu. Só escutei o Nezinho, pai do Ed dizer: “Seu Chico, seus filhos estão aí?” “Não, aqui não apareceram, obviamente nos encobrindo. Por quê? Aprontaram alguma?” “Os malvados colocaram pimenta na boca do Ed, que está lá em casa se esgoelando!” “Esses moleques não têm jeito. Deixa comigo: se eles aparecerem aqui, pego eles”. Assim que o Nezinho foi-se embora, o Chico nos levou grudados pelas orelhas lá pros fundos do bar e nos passou o maior sabão. De castigo, tivemos que limpar e deixar o bar tinindo. “Pô, Gordura. Sacanagem, me ferraste”. “Relaxa. Isto é para tu aprenderes que pimenta na boca dos outros não é refresco!” Outro dia, acompanhando os dizeres e chororôs dos políticos da paróquia joinvilense, lembrei-me deste fato da minha infância. Correlacionei. Quando o político profissional não tem a responsabilidade da decisão, colocar pimenta na boca de quem tem é refresco. Mas quando a responsabilidade de decidir é dele, ao sentir o ardor, se esgoela e chora!

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