quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Steve

Outro dia, faleceu Steve Jobs e li, numa crônica, que “poucas pessoas transformaram tanto nosso modo de viver nos últimos dez anos quanto o fundador da Apple. Sua vida é um baú de lições a todos nós”.

Talvez por eu ser jurássico e o computador, para mim, um acessório de sofrimento obrigatório e não ser muito ligado em hardware, o cara da minha mente é o Bill Gates, o do software. Até porque quando o Windows dá problema é ele que a gente xinga.

Mas a morte do Steve deu muito ibope. Esteve presente em todas as televisões, rádios e jornais com várias frases de efeito, filosoficamente bem elaboradas.

Pensei comigo: este sujeito deveria ter sido mais bem aproveitado. Deu-me até vontade de comprar um notebook da Apple, mas um amigo me disse que o sistema é diferente do do Windows. Daí é demais para minha cabeça. Já chega quando tive que abandonar a minha máquina Olivetti e esquecer as aulas que tive na Escola Nelson Miranda Coutinho, a escola de datilografia de Joinville. Agora nem datilografia é. É digitação. Tudo por causa do Steve.

A minha geração passou por esta transformação. Lembro-me das aulas de física I, como calouro de engenharia civil em 1971, aprendendo a calcular com régua de cálculo. Ganhei a minha, uma Faber Castell, do Gordurinha, que estava se formando em engenharia mecânica, primeiro curso da Udesc Joinville. Tirava-se tudo ali: raiz quadrada, cúbica, logaritmo, seno, tangente. Era o máximo.

Em estatística, usava-se para calcular aquelas Olivetti de manivela. Em computação, a linguagem que aprendi foi Fortran. O computador da escola era do tamanho de uma sala de aula. A gente fazia programa e passava para um cartão perfurado que ia para a leitora do computador. Em 1985, vi o primeiro PC no meu curso de mestrado, em Niterói. Deve ter sido um Apple. De lá para cá, a coisa não parou mais.

Fico imaginando quantos “Steves” vivem aperfeiçoando estas máquinas maravilhosas que transformaram e transformarão os próximos anos com mais velocidade e tendo o céu como limite. Dou risadas ao lembrar que todos os dias, depois do almoço, ficávamos, eu e meus irmãos, aprendendo código Morse com o Chico do Ernesto, que foi radiotelegrafista do Exército na Segunda Guerra Mundial e que não cansava de repetir: “Radiotelegrafista é a profissão do futuro!”

terça-feira, 4 de outubro de 2011

Tipos da cidade

Outro dia, fui a um enterro de um ex-aluno, jovem engenheiro civil formado da nossa Udesc Joinville, e encontrei o Vicente do Loló, amigo de infância e frequentador assíduo do mercado público. Fazia muito que não o via e acabei encontrando-o naquele ambiente triste.

“Este prefeito que está aí não é de nada. Bom era o Freitag”, começou ele a prosa e logo em seguida me “mordeu” uns trocados. O Vicente sempre foi assim, entendido em política e, se você “der corda”, ele fica horas definindo os políticos desta nossa Joinville.

Ao ele ir embora, fiquei matutando sobre ele e outros tipos que a cidade já esqueceu. Tipos da cidade afeitos a serem vítimas de chacotas, de gozações e, não raras vezes, de compaixão.

Logo me veio à mente o Donato. Nos anos 1960/70, todos que frequentavam o Mercado Público o conheciam. “Donato, vai à missa sem sapato!”, gritava um gaiato, e ele, que diziam ter sido goleiro do América, soltava impropérios aqui impublicáveis.

A Negra Emília era inconfundível, empurrando seu carrinho de mão e vestida como homem, vagando entre o bar do Chico do Ernesto, na Procópio Gomes, e a avenida Cubas.

O Laranjinha, no Centro da cidade, fumando cigarro com a brasa dentro da boca e filtro no lado de fora era uma atração, assim como era o Bananeira, que embriagado adorava discursar e não contava tempo para sair agraciando com xingamentos a mãe de quem o contestava.

A Rosa do Pé Inchado era outra figura conhecida. Perambulava pela rua do Príncipe com aquelas trouxas características, uma de bugigangas na mão e outra, de pano, enrolada e protegendo o pé inchado. Daí o seu cognome.

Por último me lembrei do Chico Sapo, o “Chiquinho da Mamãe”, sempre bem vestido, limpo e cuidado pela respectiva. Adorava discursar, mas, quando ficava irritado com alguém, logo dizia, sem perder a classe: vai-te às fezes!

Se me perguntassem para quem deveríamos erguer monumentos, eu não hesitaria, abrindo a cortina do tempo, um só momento em eleger estas figuras. Cada qual representando uma época, um assunto e um espaço. Estas pessoas foram atropeladas pela pressa destes novos tempos, mas não serão apagados de minha mente como tipos da minha cidade.