sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

Reminiscências

Cortava meus cabelos desde sempre na barbearia do velho Ernesto, com ele e, depois, com o Zé Ramos, na Joinville antiga e que ficava na esquina da Procópio Gomes com a Ipiranga. Depois de anos, e eu já estava em “outras plagas” estudando, o Ramos montou sua barbearia no mercado municipal, onde se encontra até hoje, agora acompanhado dos filhos que herdaram dele a mesma profissão. Sábado destes, fui ao mercado e, como sempre faço, passei para dar um abraço no velho Ramos. Entrando na barbearia, lotada como sempre, encontrei o Gordurinha sentado esperando a sua vez. – Cara, nem te conto – falei. – Outro dia, estava no Café Passado, simpático bistrô de Laguna, junto à praça de Anita, quando a Téia, dona do bistrô, me perguntou: “professor, a piada deve ter sido boa, socializa com a gente?” Olhei pra ela e disse: “não entendi”. Ela, sorrindo, falou: – Desculpe, professor, mas estavas sorrindo sozinho e fiquei curiosa do porquê. – Ah – disse eu: – Reminiscências de infância. Estava olhando para aquele casal lá daquela mesa e lembrei do meu brother Gordurinha e de uma gaiola onde ele tinha preso uma gaipava e uma cambacica. Eu nunca sabia quem era quem, e sempre lhe perguntava. Ele, invariavelmente, respondia: “de novo, Pirulito. Já te disse que não importa saber isso. Importa que elas comam, bebam, cantem e pareçam alegres, mesmo estando na gaiola. Gostaria de soltá-las mas já nasceram cativas e morreriam se tivessem que sobreviver sozinhas”. Ela me olhou com cara de espanto, pois não entendeu a metáfora. Então, eu lhe disse: – A semelhança é que, olhando aquele casal, tal qual acontecia com os passarinhos, não consigo identificar qual é a cambacica e qual a gaipava. E isso me fez voltar aos velhos tempos. Os tempos de hoje estão mudados e, ao olhar para eles, lembrei da filosofada do Gordurinha: importa que elas comam, bebam, cantem e parecem alegres, mesmo estando na gaiola. E essa lembrança da infância é que me fez sorrir. – É a tua vez, Gordurinha – disse o Zé Ramos. – Beleza, Brother, até a próxima, fui!

segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Emoções

Ontem foi dia de grandes emoções.......... Obrigado aos formandos de Arquitetura e Urbanismo, 2015/1, UDESC/Laguna, pelo honroso convite para ser PATRONO da turma........foi muito significativo receber o convite feito por voces e, principalmente, em sala de aula de outra turma.....voces não imaginam a importância deste ato de reconhecimento.... Depois tive outra surpresa....a homenagem por professores, tecnicos e inumeros alunos após encerrar a minha última aula oficial como professor da UDESC ...34 anos como professor desta importante instituição do Estado de Santa Catarina... Obrigado a todos que participaram da homenagem ....me aposento da UDESC, mas não da vida e que venham novos desafios...... Cada lágrima, cada olhar, cada carinho e cada abraço apertado fez passar um filme na minha cabeça.......aos dez anos de idade (52 anos atras) eu iniciava a minha vontade de ser engenheiro, quando ia do Bucarein ao centro de Joinville, estudar no Colégio Bom Jesus, diga-se de passagem com bolsa de estudo, e admirava a construção da Catedral....ali começava a vontade de ser Engenheiro Civil....até hoje muito se passou e por muito tempo dividi projetos e obras com as aulas no curso de Engenharia Civil da UDESC/Joinville e nos últimos cinco anos no de Arquitetura e Urbanismo da UDESC/Laguna. Como sempre digo, a vida é uma curva senoidal. Chegou a hora da inflexão, da mudança de onda, conciente de que a mudança de onda faz parte das nossas vidas, visto que ela ocorre naturalmente na natureza, como podemos observar nas ondas do mar, do som, da luz........ Obrigado a todos que participaram desta parte da minha história de vida...de muitas alegrias e, também, de tristezas...de muitas vitórias e também de derrotas...vida real...de sonho sonhados...uns realizados e outros por realizar..... Valeu cada momento vivido com voces em Laguna e como sempre digo, fui muito feliz aqui pessoalmente, com o que realizamos no CERES e pelo que deixamos para esta cidade........ Quero por último agradecer pela musica que voces colocaram no filme que fizeram pra mim....inclusive com as fotos minhas e da Albertina. Foi um tiro certeiro! De Volta Pra Casa Cássia Eller Mudaram as estações Nada mudou Mas eu sei que alguma coisa aconteceu Tá tudo assim tão diferente Se lembra quando a gente chegou a um dia acreditar Que tudo era pra sempre, sem saber Que o pra sempre, sempre acaba Mas nada vai conseguir mudar o que ficou Quando penso eu alguém, só penso em você E ai então, estamos bem Mesmo com tantos motivos Pra deixar tudo como está Nem desistir, nem tentar agora Tanto faz Estamos indo de volta pra casa Obrigado a cada um que esteve comigo ontem de corpo presente e aos que estavam em espírito....... Aqueeeeeeellllle abraçooooooooooooooooo.............

sexta-feira, 14 de novembro de 2014

FALSIDADES

“Alemão, te arruma que vais ao enterro do Zé da Carmela comigo”, disse meu pai. “Eu que tinha 13 anos e não era chegado a enterros, argumentei: Oh pai, me tira desta”. “Não, pois já está na hora de encarar aquela que é a grande realidade da vida. A morte!” Lá fomos nós. Entramos na casa da Carmela e, depois das condolências, estacionamos num espaço de onde se via o Zé. Estático. Lívido, com fisionomia tranquila. Foi uma boa pessoa. Ato contínuo entra na sala o Juca da Arminda, conhecido como “Bosta de Vaca”. Cumprimentou a Carmela, a viúva e os filhos com abraços e beijos faciais. Postou-se ao lado do caixão e, parecendo emocionado, derramou lágrimas face abaixo. “Pai, porque o apelido dele é Bosta de Vaca? Ele parecia emocionado com a morte do amigo”. “Porque aquele é do tipo de gente que mata e chora no enterro da vítima. Por fora seco e por dentro mole e fedorento. Aprenda uma coisa: Quando o crocodilo engole uma presa, ele chora, mas, não significa que esteja sentindo pena. Daí a expressão "lágrimas de crocodilo", que quer dizer que, embora a pessoa chore, suas lágrimas não significam que esteja sofrendo, mas sim fingindo.” “Já que falastes disso, sabes por que se diz abraço de tamanduá?”, perguntei. “Esta é outra expressão que significa falsidade. Quando você recebe abraço de uma pessoa que quer o teu mal, dizemos que essa pessoa está dando um “abraço de tamanduá, porque ele abraça suas presas e crava em suas costas suas garras mortais”. “Mas pra mim, disse ele, a pior falsidade é o ósculo de Judas. Judas ao vender o mestre por 30 moedas combinou com os soldados romanos, que o traído era o que recebesse dele um beijo na face. Claro que Jesus sabia da traição, mas não se abalou. Nesta vida muitas vezes serás traído, mas o importante é não se abalar. Quando a pessoa é falsa contigo, ela chega ressabiada, não olha nos teus olhos devido ao peso na consciência. Aguente firme! A vida é como o eco. O que a gente emite volta pra nós, da mesma forma e intensidade. Por isto, Alemão, lance sempre o bem, que terás o mesmo de volta, mas mesmo assim te prepares para receber dos teus “Bostas de Vacas”, Lágrimas de Crocodilo, Abraços de Tamanduá e Ósculos de Judas!”

terça-feira, 2 de setembro de 2014

Meu caminho

Em Julho fiz o Caminho. Eu e mais dois amigos partimos de Saint-Jean-Pied-de-Port, cidade francesa aos pés dos Pirenéus, para Santiago de Compostela, noroeste da Espanha. 815 Km andando. Em Santiago repousam os restos mortais de Tiago Maior, um dos doze apóstolos de Jesus, guardados numa arca de prata no porão da Catedral dedicada ao Santo. Do surgimento do templo à formação de uma importante rota de peregrinação foi um passo. Peregrinos acorrem de todo o mundo. Uns vêm por Portugal, pelo chamado Caminho Português; outros vêm do restante da Europa formando diversos trajetos, sendo o mais célebre o Caminho Francês, o que fizemos. No dia 7 de julho, estávamos em Nájera, município da região que dizem ter o melhor vinho espanhol, a de La Rioja. Todos os dias, após 9 horas de caminhada, procurávamos um albergue para dormir. Como nos municipais não têm televisão, resolvemos ficar em um privado. Afinal, tinha jogo do Brasil. Na hora marcada, os interessados pelo jogo estavam reunidos no refeitório do albergue. Três italianos. Dois espanhóis. Três franceses. Cinco alemães e nos, três brasileiros. Conversa vai e vem, um dos Italianos me pergunta como eu acho que vai ser o resultado. Respondo que não sei, mas espero que o Brasil jogue bem apesar de reconhecer que o time alemão é muito bom. Um dos espanhóis comenta que o Brasil perderá, pois o time é dirigido por um técnico empafioso e ultrapassado e completou: “chegou até aqui por sorte!”. “Tá bom, vamos ver!”, pensei. Começou o jogo e o alemão sentado ao meu lado, entre um gole de “San Miguel”, cerveja espanhola, e outro, batia na mesa e vibrava. Eu sentindo o sufoco, fiquei pasmo, olhando sem acreditar no que estava acontecendo. Só dava os “tedescos”, diziam os italianos. “Zupa” gritou o alemão! Um a zero! Zupa! Zupa! Zupa! Zupa! Nestas alturas eu já entendia “Chupa!”. De imediato lembrei-me do Gordurinha ditando as regras das nossas peladas no campinho de areia, do bairro Bucarein, na nossa Joinville: “cinco vira, dez acaba!”. Acabou o primeiro tempo, dei uma enrolada, me levantei e disse: “Je me vais dormir”. “mañana tengo el camino” . “Gute nacht!” Todos riram. Subi as escadas e enquanto escovava os dentes: “Zupa”, escutei o alemão gritar. Seis! Coloquei o protetor auricular, como se deve fazer em um albergue para não escutar roncos, gemidos e afins, e dormi. Sai antes de o dia amanhecer e só fui saber o resultado três dias depois, quando passamos por outros alemães e eles não se contiveram ao verem a bandeira do Brasil na mochila do meu parceiro de viagem e gritaram: “sieben und kleine war” (sete e foi pouco!”). Pela gargalhada deu pra imaginar o que diziam. Apertei o passo e sumi!

terça-feira, 17 de junho de 2014

O FANATISMO DAS TORCIDAS

– E aí, Gordurinha, empolgado com a Copa? – perguntei. – Pô, Pirulito, tu sabes que gosto de futebol, mas que não torço por time nenhum. Aliás, para ser sincero, torço sempre para o ganhador. Não tenho problema nenhum em começar o jogo corintiano e acabar palmeirense. O carinha troca de casa, de carro, de emprego e até de parceira, e não troca de time de futebol? Burrice. Torcer para um time só te torna fanático. Quando vejo o fanatismo das torcidas fico meio arredio em frequentar estádios. Imagina ir ver o time que gosta e morrer com um vaso sanitário na cabeça, lançada por um fanático qualquer, como aconteceu em Recife? – Pois é, brother, que loucura. – O amor pelo futebol pode ser aceitável, mas, em vez de ser encarado como um lazer, acaba sendo, por muitos torcedores fanáticos, um desatino exagerado, virando doença, e aí não dá. Não consigo entender carinhas, na maioria das vezes financeiramente ferrados, viajando para assistir a jogos do seu time em outros Estados. Tem cara que ganha uma camisa com as cores do maior adversário e não veste. Neguinho coloca a amizade em risco se o outro falar mal do seu time. Até acho que futebol é saudável enquanto é tratado como lazer e prazer, mas entendo que colocá-lo como uma crença, tornando-se fanático, leva o indivíduo a agir irracionalmente. Vira um comportamento doentio, no qual o mundo gira apenas em torno do futebol e de seu time. Estou fora! Retruquei: – Cara, por falar nisto, eu tinha um casal de amigos que a mulher era louca pelo Vasco. Um domingo qualquer, fomos almoçar juntos e, ao voltarmos para a casa deles, vimos a porta da casa arrombada. Como manda o figurino, entramos devagarinho, até nos certificarmos que os larápios já tinham se evadido. De repente, escutamos um grito da mulher dele: “Flamenguista nojento!” Corremos até o quarto onde ela estava. Vascaína doente, daquelas de escutar o jogo com o radinho de pilhas grudado na orelha esquerda, porque na direita dava azar, estava petrificada olhando para a cama. Rapaz, que imagem patética. Acho que o larápio, pelo feito, era mesmo flamenguista. A cena era dantesca: a camisa do Vasco estendida sobre a cama do casal e em cima uma horrorosa obra. Ainda por cima, era um ladrão pândego e cagão. Meu amigo até hoje paga analista para a mulher dele, pois a visão daquele ato, para uma torcedora fanática, é coisa que só análise resolve. Cena para se dar uma bela gargalhada, mas quem teria coragem? Não sairia dali vivo!

sexta-feira, 18 de abril de 2014

Em que 1964 te influenciou?

Como as polêmicas do momento são a Comissão da Verdade, a revolução de 1964, comunismo, esquerda, politicamente correto e corrupção, perguntei a alguns sessentões amigos meus: “Já que, como eu, viveste grande parte da vida no regime de exceção, no que isto te influenciou?” Invariavelmente, todos responderam: “Em nada!” Coincidiu com o que penso. Eu tinha 12 anos em março de 1964. O que fiz neste período: joinvilense que sou, estudei o primário no Rui Barbosa, o ginásio no Bom Jesus (com bolsa de estudo oferecida pela grande mestra Ana Maria Harger), o técnico em metalurgia na Escola Técnica Tupy e engenharia civil na Escola de Engenharia de Piracicaba, SP. Nunca me incomodei com os militares, nunca fui preso nem torturado. Dirão os jovens que não viveram este período – mas que se baseiam na leitura dos que estavam no exílio, fazendo intercâmbio e que voltaram e estão indenizados e aposentados, ou mesmo daqueles que aqui ficaram e resistiram fazendo política de oposição – que fui um alienado. Pode ser. Mas também posso dizer que conheci, quando estudava engenharia em Piracicaba, vários ideólogos de escrivaninha que queriam nos convencer que deveríamos lutar pela democracia, mas não nos diziam qual era ela, pois ninguém me impedia de nada que não fosse ilegal naquele regime. Estudei, estagiei, me diverti, viajei de carona por vários Estados, conheci muitas pessoas, me formei, trabalhei muito, casei, tive filhos e não vi nada ou ninguém que me proibisse de nada. Não sei dizer o que aconteceria se o tal comunismo que pregavam os que queriam nos convencer a entrar no esquema realmente tivesse acontecido. Se eu pensar neste povo que tem governado o Brasil nos últimos 20 anos e que estava por trás do movimento contra 64, acho que influenciaria para pior, pois hoje o que vemos é um liberalismo absurdo, uma falta de consciência e de civismo, um vale-tudo assustador. No governo militar, e ninguém pode falar o contrário, vimos o Brasil fazer quase todas as hidrelétricas que hoje abastecem o País de energia. Vimos surgir universidades. Vimos a construção de boas estradas. Eu mesmo trabalhei na Rodovia do Açúcar, no Estado de São Paulo. A única coisa que não fazíamos era votar para presidente, que foi o mote para terminar com o regime militar. Pois bem, passamos a votar. Collor, FHC, Lula e Dilma. Hoje, podemos fazer o que não podíamos (ou quase podemos?), falar mal e criticar os presidentes. Mas, em compensação, o resto das notícias é só sacanagem e de todos os tipos, mas sempre com um foco só: o de locupletação com o dinheiro público

domingo, 16 de março de 2014

Discurso Paraninfo Arquitetura UDESC – Laguna

Discurso Paraninfo Arquitetura UDESC – Laguna Anselmo Fábio de Moraes / 15/03/2014 Quando o Alexandre foi na minha sala e me convidou para a formatura desta turma especial, tive um imenso prazer em receber o convite, pois a deferência de ser convidado pessoalmente para este grande ato da vida de voces, dos seus pais e porque não dizer da nossa, seus professores, é um prêmio. A gente convive pelo menos cinco anos e quem se envolve, se interessa e participa da vida e da formação de seus alunos, não tem como não se emocionar. No entanto, após ele sair, eu fui ler o convite. Ai a emoção foi muito maior. Eu estava sendo convidado para ser o Paraninfo da turma e não tinha entendido. Adoro a vida, pois nela existem coisas que se repetem mas, mesmo sendo repetição, são como se fossem a primeira vez. Ser paraninfo de uma turma de formandos sempre vai parecer ser a primeira vez. Não lembro quantas vezes já fui, nestes meus trinta e três anos de UDESC, mas posso garantir para vocês, esta tem a sensação de única. E é, porque esta turma é especial, única. A alegria profunda que senti ao ler o convite, só não foi maior por que o Alexandre já tinha saído e não pude dar nele aquele abraço apertado de agradecimento. Mas pude ver, num filme relâmpago a fisionomia de cada um de voces, das aulas, das festas de amigo secreto nas épocas natalinas e do carinho e respeito com que sempre nos tratamos nos corredores e salas, da nossa escola. Talvez, quando decidiram me convidar nem imaginavam a satisfação que me dariam, pois no meu entender, ser paraninfo de uma turma é o ápice para um professor, é a láurea máxima que este pode receber. Por isto agradeço a vocês pela deferência. Senhores pais: obrigado por incentivarem seus filhos a virem para Laguna e cursarem Arquitetura e Urbanismo na universidade dos catarinenses. Podem ter certeza que eles estão preparados para o mercado de trabalho. Gostaria de parabeniza-los, também, pelos filhos que vocês têm. Nós que convivemos estes últimos cinco anos com eles sabemos da índole, do caráter e do potencial de cada um deles. Recorro a Gibran Khalil Gibran, que escreveu sobre os filhos no livro “O Profeta”, para vos homenagear: Vossos filhos não são vossos filhos, dizia ele. São os filhos da ânsia da vida por si mesma. Vêm através de vós, mas não são de vós. E embora vivam convosco, não vos pertencem. Vós sois os arcos dos quais vossos filhos são arremessados como flechas vivas. O arqueiro mira o alvo na senda do infinito e estica com toda a sua força, para que suas flechas se projetem rápidas e certeiras. E eu completo: que bons arqueiros sois vós, pois ao vermos estes jovens, nesta noite, terminando com júbilo esta faze da vida, podemos dizer que vocês acertaram o alvo. E é só isso, que todos nós pais, sempre queremos. Senhores pais: são vossos filhos que estão na berlinda, na carruagem dos sonhos, mas esta noite também é de vocês. Celebramos neste momento o sucesso deles, mas não menos o da educação que deram a eles. Eles estão formados, arquitetos e urbanistas e daqui partirão para conquistar o mundo, portanto, respirem fundo, libertem a emoção, sorriam, chorem. Vale tudo neste momento de alegria! Meus queridos apadrinhados: O que estamos fazendo aqui hoje é um rito de passagem, enrijecido pela dor da despedida mas, esperançoso pelo início de uma nova fase na vida de voces! Gostaria de relembrar que todos nós viventes deste mundo, sempre desejamos viver uma boa vida, feliz, prazerosa e vitoriosa, mas, só a conseguiremos se nos esforçarmos, trabalharmos com afinco e, principalmente, se formos éticos, preservando bons valores e o aprendizado que recebemos de nossos pais, desde que saímos do berço. Esta fase da qual vocês se despedem hoje, teve as dificuldades que pertencem a ela. A próxima fase, digo do alto dos meus mais de sessenta anos de idade e de quase quarenta de engenharia, terá outras responsabilidades, outros compromissos e, de certeza, será mais trabalhosa e, consequentemente, parecerá mais difícil! Um dia lembrarão como foi doce esta fase que hoje se encerra. Na minha Joinville existe um doce alemão, recheado de maçã, chamado apfel strudel: esta fase foi a de comer a maçã. A partir de amanhã, sinto-vos dizer, passarão a comer a massa. Mas não se preocupem, vocês têm lastro para superá-la, visto que estão bem formados. Vocês, tenham orgulho, são filhos da UDESC! Esta nova caminhada pode ser boa também, trabalhosa sim, mas se vocês agirem com sabedoria, humildade e amor pelo que fizerem, pela profissão que escolheram, ela será boa. Tenham certeza disto. Amar sua profissão e fazer com prazer suas tarefas sempre vos dará prazer. Deixará a vida leve e satisfatória. Quando vos sentires sós, tristes ou achando que não existe luz no fim do túnel, não se desesperem. Eu sei que não é fácil, mas também sei que a vida é uma curva senoidal. Um dia estamos por cima e outros por baixo. E é importante saberem disto, porque se levarem isto como valor de vida e respeitarem, agirem com amor e gentileza quando a curva está no seu lado positivo, sempre, terá um ombro amigo quando a fase negativa chegar. E é nele que deverão se apoiar. Não tenham medo de buscar seus sonhos. Inspirem-se em Fernão Capelo Gaivota. Richard Bach quando escreveu a história desta gaivota, igual no formato, mas diferente das outras de sua espécie no modo de agir e pensar, e que era inconformada do voar comum apenas para conseguir comida, quis nos dar alento. Fernão se preocupava com a beleza do voo, em aperfeiçoar sua técnica para executar voos cada vez mais perfeitos, seguindo muitas vezes na contra mão dos conceitos consolidados. Comportamento difícil e muitas vezes não entendido. Mas ela não desistia de buscar seu sonho porque ela sabia que podia mais. Com foco, determinação, criatividade e muito suor vocês conseguirão sucesso como Fernão conseguiu. Acredite “Voa mais longe a gaivota que persiste mais e sempre tenta voar mais alto.” Quanto ao serviço, façam bem feito! Não importa o tamanho! Façam bem feito! Façam com amor, pois só assim vocês tirarão proveito e satisfação do que fizeram e o tempo parecerá mais leve. Porque querendo ou não ele passa e, no balanço final, a gente será lembrado pelo que fez, pelo que deixou de legado! Por último, meus queridos: não se esqueçam de ser felizes. Voem alto, mergulhem fundo, procurem sempre um novo caminho. Tentem, recomecem, insistam. Não desistam nunca. O que de pior podemos fazer é não tentar, desistir antes de começar! Valorizem suas conquistas, reconheçam e agradeçam a quem lhes ajudam na caminhada, desde as pessoas mais simples até aquelas que estão hierarquicamente acima de vocês. Sejam sensíveis, sejam humildes e, principalmente, sejam felizes. Encerro dizendo que não esqueçam o que disse John Lennon: “A vida acontece enquanto fazemos planos”. Portanto: façam planos, mas não se enrosquem neles. Vivam! Sigam em paz. Sejam esforçados, criativos, tolerantes, justos, honestos e éticos. Tenham sucesso, mas não esqueçam, nunca, que o preço do sucesso é o suor! Que o Grande Arquiteto do Universo abençoe e guarde todos nós! Boa noite!

terça-feira, 11 de março de 2014

Trash Art

Segunda de Carnaval fui a Itajuba (Barra Velha). Minha praia desde os anos 1950. Cheguei e fui direto ao Bom Gole, nome sugestivo e, de certeza, um bar pequeno, mas muito bacana. Um espaço democrático onde você encontra surfistas, coroas, como eu, e nativos contadores de história. Fui matar saudades e rever o Pablito e o Martin, donos do espaço, e, para meu deleite, curtir a trash art do Martin Sanchez. Herdou da mãe, Grassiela Grassi, a artista argentina que se radicou naquela praia e que, por anos, colhia lixo nas areias da praia do Sol, seu quintal, transformando-o, com extrema criatividade, em arte. Sementes, madeiras, ossos e palhas que, misturados com tintas de várias matizes, enfeitam paredes por este Brasil afora. E como se dizia antigamente que a fruta nunca cai longe da árvore, o Martin, que ajudava a mãe desde tenra idade a catar aquilo que para pessoas normais é lixo, após a ida de Grassiella para o oriente eterno, começou a fazer a sua própria criação. A transformar lixo em arte. Seus principais trabalhos representam a natureza. Seus peixes, corujas, crustáceos e máscaras tribais são peças que surgem a partir de madeiras de barcos, sucatas metálicas, ferramentas obsoletas e objetos dos mais variados, já utilizados e que foram descartados ou que as marés deixam nas costas das praias de Itajuba, onde mora. São criações confrontadoras e, ao mesmo tempo, divertidas, que nos remetem ao lado obscuro do que desprezamos, mas que ganham “vida” na imaginação e na criatividade do artista. O uso desta matéria-prima, com a qual ele confecciona seus quadros, criando uma arte diferenciada, nos propõe um olhar crítico em relação às questões de consumo e daquilo que consideramos lixo. O método dele é meio pautado na bagunça mesmo, pois só dessa forma consegue liberar a energia criativa, que pode nascer dos pés descalços nas areias da praia, no viajar da prancha sobre as ondas na praia do Syphodys, ou, mesmo, ao toque do vento no rosto, quando sentado nas pedras brancas do costão da Itajuba. A produção não é grande e a venda é rápida, mas, com sorte, pode-se curtir os quadros; neste final de semana eu tive, pois algumas obras enfeitavam a entrada do Bom Gole.

terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

Bons e saudáveis tempos

Outro dia, meu brother Gordurinha me convidou para comer um sopão de verduras com carne. Na infância, tínhamos este hábito. Era a comida de sábado lá em casa. Nosso pai afirmava que a sopa é um alimento com uma importância nutricional extraordinária. Antigamente, era costume comê-las. Hábito trazido pelos europeus e por nós adotados, até pela necessidade. Entre uma colherada e outra, falávamos sobre as facilidades do viver hoje em dia e que a industrialização alterou, sem medidas, os costumes da nossa infância. Disse ele: “Lembra que para ir até Itajuba de ônibus a gente levava quatro horas?”. Comentei: “Se o rio da estrada do Inferninho (em Araquari) não estivesse cheio, pois, quando estava, o ônibus tinha que ficar esperando a água baixar para passar”. “É verdade”, comentou o Gordurinha. “Outra coisa que mudou muito foram os fogões”, e emendou: “Quando a gente fala para os filhos que os fogões nos anos 1950 tinham como fornecedor de calor o fogo da lenha ou da serragem, eles não acreditam. Esta geração é do gás, do elétrico ou do micro-ondas. No Bucarein antigo, o que mais existia era fogão queimando serragem, já que ali ficavam as serrarias que desdobravam as toras de pinheiros, que vinham da região de Campo Alegre, para serem exportadas para a Europa. A vó Maria só cozinhava no fogão que queimava serragem. Eu, uma vez por semana, tinha que buscar um saco da dita na serraria da família Brandt. A única coisa boa da história é que ela tinha sobre o fogão dois varais de arame onde, invariavelmente, pendurava corvinotas e paratis para ficarem defumando. Como prêmio, sempre fazia para mim peixe assado com nylon (pirão de farinha de mandioca escaldado). Bom demais”. Esta conversa me trouxe à lembrança meus amigos Orestes (Tinho) e Floriano (Dido), a dona Juracy, mãe deles, o seu João Calafate e a dona Balduina, seus avós. Moravam na casa vizinha à nossa e o fogão, que ficava no rancho dos fundos da casa, nunca apagava. A serragem queimava dia e noite, e me chamava a atenção a gentileza com que dona Balduina revirava o conteúdo da panela de barro com uma colher de pau. Certa vez, curioso, lhe perguntei o que fazia. Ela respondeu: “Sopa de verduras”. Passei a infância vendo os avós de meus amigos comendo sopa de verduras. Viveram cem anos. Sempre no mesmo ritmo. Ele, no quintal plantando e colhendo verduras, e ela, preparando a sopa no fogão movido a serragem. Bons e saudáveis tempos.

terça-feira, 14 de janeiro de 2014

DEZ DE JANEIRO

Nesse dia, por anos, uma figura ímpar saía da Avenida Cubas vestida de mulher, porque assim o era, ao contrário dos outros 364 dias do ano em que se vestia de homem. Figura magra tinha aquela negra que transitava entre os estivadores e os outros que frequentavam o bar do Chico do Ernesto. Entrava e saía com desenvoltura e respeito, argumentando, discutindo e vivendo uma vida totalmente estranha aos ditames da época. A negra Emília fazia aniversário nesse dia. Ela e o Chico do Ernesto (Francisco Amarante de Moraes). E este era o dia escolhido por ela para não beber, se vestir de mulher e trazer um ramalhete de flores para o Chico. A repetição desta cena, por anos, ficou na memória deste que escreve, pois teve a felicidade de se criar na esquina da Procópio Gomes com a Ipiranga (hoje Plácido Olímpio de Oliveira), local do ato, e viver a época da estiva e dos estivadores, que tanto ajudaram no desenvolvimento de Joinville, através do seus esforços no carregar e descarregar mercadorias dos navios que aportavam no cais do Bucarein. Bons tempos de rio Cachoeira limpo e navegável e de um bairro ordeiro e divertido. Todos sabiam que ao final do dia estariam ali no bar reunidos, os amigos do Chico e da Emília, para comemorarem os aniversários e curtir sambas do bom, tocados pelo Bera no seu bandolim, negro Buião no pandeiro e Loli no violão de sete cordas. Nenê Castelhano, Negro Alemão, Barata e Baratinha, os irmãos Caneta, Melão, Lula, China, Jacaré Diniz, professor Kavanagh e tantos outros, que fizeram a história do bairro e, por conseguinte, a de Joinville, invariavelmente, estavam lá. Bons e felizes tempos. Escrevo estas linhas coberto de felicidade pela lembrança, mas com a dor da saudade, considerando que em algum outro plano do universo, onde se encontram os que já se foram, a negra Emília estará, com um ramalhete de flores nas mãos, vestida de mulher e se encontrando com o Chico e todos os outros que já partiram. Para aqueles que já tiveram seu pai levado para o Oriente Eterno pelo Grande Arquiteto do Universo, divido a letra da música de Sérgio Bittencourt: " Naquela mesa ele sentava sempre/ e me dizia sempre o que é viver melhor/ Naquela mesa ele contava histórias/ Que hoje na memória eu guardo e sei de cor/ Naquela mesa ele juntava a gente/ E contava contente o que fez de manhã/ E nos seus olhos era tanto brilho/ Que mais que seu filho/ Eu fiquei seu fã. São mais de dez anos sem o Chico, mas este dia, sempre, me faz voltar no tempo, sorrir, lacrimejar e ficar curtindo a história de quem a viveu.