quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

Avolta

Quando o Dico, o Back e eu atravessamos a ponte sobre o rio Órbigo e entramos no município de Hospital de Órbigo, do século 16, província de León, com população de 1.028 habitantes, já passava das duas da tarde. Naquele dia, andamos 32 km e, como acontecia em todos os outros 24 que percorremos no caminho francês de Santiago de Compostela, estávamos exaustos. Logo encontramos um abrigo. Albergue Paroquial Karl Leisner, onde fomos recebidos com refrescantes copos de água, benditos naqueles dias escaldantes de julho. Naquela noite, resolvemos fazer bifes acebolados. Ainda não havíamos comido carne, neste formato, durante a caminhada. Passamos em uma carniceira e compramos alcatra. O Back foi para a cozinha e caprichou no preparo. Dividíamos a mesa do albergue com um casal já conhecido de outras paradas, JJ, francês, e Sun, coreana, uns japoneses e uma italiana baixinha, namorada de um holandês enorme, todos admirados por comermos carne naquela quantidade. A italiana, querendo puxar conversa, falou: “Tive um amigo brasileiro que me ensinou uma frase quando voltávamos de uma viagem”. “Legal”, disse o Dico. “E como era?”. “A volta é foda! Mas nunca entendi direito o que o ragazzo quis dizer.” Rimos, e o Dico tentou explicar para ela que ele queria dizer que a volta é difícil. Dias depois, subimos o El Cebrero, seis horas morro acima, 1.300m de altura. A descida estava tranquila, mas, numa encruzilhada, inventamos de pegar a estrada asfaltada, em vez da trilha pela mata. Dois quilômetros depois, de descida, encontramos um casal de agricultores. “Buenos días”, diz a senhora. “No es que me interesa. Pero dónde van los señores?” Ao que respondemos: “Para Santiago”. “Están en el camino equivocado. Tienes que volver y coger el camino hay al pie de Cebrero!” Cabreiros, agradecemos e encaramos os dois quilômetros de volta. Pura subida. Quando estávamos chegando ,comecei a rir, e o Back me falou: “Pô meu, só subida depois de errar o caminho e tu ainda ficas rindo?”. “Lembras da frase da italiana no albergue, outro dia? O cara que ensinou para ela tinha razão. Errar o caminho tudo bem. Mas a volta é foda!Daí a graça”.