quarta-feira, 17 de julho de 2013

Pimenta Malagueta

“Cara, lembra do bar do Chico do Ernesto? Naquele tempo, no Bucarein, a gente chamava de venda, e vendia de tudo. Cimento a quilo (vinha da Alemanha em toneis), carvão, cigarro avulso, verdura, pão, linguiça, bebidas alcóolicas. O que se comprava era anotado na caderneta e o pai ia lá todo final de mês pagar a conta. Imagina isto hoje em dia. Eu adorava ir lá comprar e prá sacanear o seu Chico eu metia a mão em um abacate e fazia que apertava. O pito era imediato. Não aperta o abacate que isto não é peito, gritava ele”, comentou comigo o Orestes. “Pois é”, respondi. “Aquele bar era uma escola. Uma das coisas que eu admirava era ver o Chico do Ernesto e o Chico Apati, o húngaro, disputando para ver quem comia mais pimenta malagueta. Cara era coisa de louco. Dez, doze mastigadas sem fazer cara feia. E o Do Ernesto ainda nos dava aula: a pimenta faz bem. Acostumando com o sabor ardido, pode-se aproveitar das propriedades dela que impactam positivamente na nossa saúde. Talvez dai eu tenha adquirido o gosto por ela”. “Então Orestes, o Diego, meu filho, que cozinha lá pelas bandas de Sydney, veio passar uns dias de férias aqui em casa. Amparado em um diploma australiano de chef de cozinha, preparou pra mim um molho de pimenta perna de moça. No começo não botei fé. Me ensinar a comer pimenta, o pirralho? Brother, ficou de lamber os beiços, até pelo ardor. Foi o melhor molho de pimenta que provei nesta minha atribulada existência. Outro dia acabou e preparei outra porção, só que desta vez acrescentei malagueta. Ficou mais ardido, mas nem chegou perto no sabor”, concluí. “Faz sentido”, diz o Orestes. “A gente não acredita na piazada, mas nestas épocas de conhecimento compartilhado, eles nos superam fácil. Com estudo conhecem a arte de fazer dosagens, assim podem aprisionar com perfeição, numa garrafa, o aroma e o sabor picante das pimentas. Falando nelas, lembra do dia em que o Jonas mostrou ao Serginho como se comia uma. O sacana fingiu mastigar, engoliu e disse ao desconfiado alemão: põe na boca e mastiga. Não arde. Viste eu comer e está tudo bem. Este acreditando, mastigou e sai correndo em volta da casa com a boca aberta para pegar vento e ver se passava o ardor. Resultado: o Pai dele o levou no Sandu (SAMU, da época) pois o alemão não parava de chorar. O Jonas, que não era tolo nem nada, sumiu lá pra bandas do Portinho”.

terça-feira, 9 de julho de 2013

MANIFESTAÇÕES

“E ai Gordurinha, que tal as manifestações? O povo nas ruas?” “Pô Pirulito, como alguém já disse, não se engana todo mundo o tempo todo. O embuste está acabando. Até outro dia, alardeava-se que milhões tinham saído da linha de pobreza. Podia-se comprar carro sem imposto, casa, bolsa disto e daquilo, além do milagroso PAC. Empolgação pela copa e olimpíadas. Na ditadura tivemos o milagre econômico do governo Médici. Lembras? Havia o mesmo clima de ufanismo no governo e de euforia na população. Ninguém mais segura este país, era o slogan. O General Médici vangloriava-se do "milagre brasileiro" apontando-o como uma conquista do regime militar, assim como fazem hoje, os de esquerda em relação à economia. Porém, a fase de prosperidade tinha muito mais causas externas do que internas. Quando a situação econômica mundial mudou, o "milagre brasileiro” chegou ao fim e teve um custo social e econômico altíssimo para o Brasil. Parece que a história se repete e o povo está caindo na real. Milhões de insatisfeitos nas ruas, pois agora não temos o AI5 e a borracha da PM é mais macia que a do exército. Mas confesso que me veio à cabeça o Chaves com sua Revolução Bolivariana”. “Pois Gordura. A não ser que o exército apoie o governo instalado e não duvido. Acho que vontade da esquerda, em tomar o poder de vez, não falta!” “Pois então. Mas em 64 o exército teve o apoio do povo. Lembra do programa Ouro para o Brasil?” diz o Gordura. “Claro, a mãe mandou eu levar dois anéis de ouro e colocar na urna lá na praça Nereu Ramos. E eu fui, com 12 anos, todo orgulhoso em ajudar”. “Pois é. Hoje com esta roubalheira o ouro da dona Nilza não chegava na esquina! Me preocupa a falta de lideranças no movimento e, até onde consigo perceber, a falta de um objetivo claro. Lembra quando a gente ia caçar rolinha de schloida? Te dizia: mira em uma, pois se atirares a esmo vais matar a mais tola e fraquinha do bando.” “Claro que lembro. Eu era ruim de mira e nunca acertava nada!” “Então. Se o processo continuar só com a turba desfilando nas avenidas sem objetivo claro, a malta vai crescer e o movimento fugir do controle. Te pergunto: num crescente de vandalismo a coisa será manifestação ou terrorismo?” “Acho que terrorismo.” “Bom, daí o cassetete muda. Sai de cena o da PM e entra o do exército, pois é atribuição deste combater terrorismo. Para ser instalado um estado de exceção é um passo”. “Gordura, tu és um craque em lógica”. “Espero estar errado, mas sempre tenho comigo que entrar em briga é fácil. Difícil é sair com o sentimento de derrotado pois, isto, pode levar a atos extremos. Espero estar errado e que a democracia persista, senão vai sobrar para os mais tolos e fraquinhos!”