terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Jacatirão

Que Joinville é a Cidade das Flores, todos nós sabemos (apesar de já ter sido muito mais), pois convivemos com elas durante todo o ano, nas praças e nos jardins das residências. Dizia um amigo meu, que não é daqui, outro dia, que é capricho de alemão. Eu lhe respondi: “Sem dúvida que a nossa origem ajuda, mas, hoje, apesar de ela ser uma cidade miscigenada e cosmopolita, ainda se insiste em conservar o hábito de ter jardim em casa”, pois o plano diretor vigente propõe isto. Apesar de que se tem falado muito em verticalização, em condensar para diminuir o custo da cidade, eu, sinceramente, espero que não aconteça. Uma das coisas mais agradáveis de Joinville é andar pelas ruas observando os jardins das casas e vê-las separadas umas das outras e não grudadas sem ventilação e sem sol nas janelas, como se vê em outras cidades.

Não sei se todos notam, mas uma das características mais marcantes e belas da nossa região se apresenta nesta época de final de ano.

Este era o tempo de escutar meu pai dizer: “Jacatirão floresceu, tem caranguejo correndo no mangue”. 24 de dezembro era dia de caranguejada em casa, acompanhada de pirão de feijão-preto, salada de cebola e tomate e uma boa “Faixa Azul” da Antarctica, além de olhar do quintal de casa para o morro do Boa Vista e observar o multicolorido das flores do jacatirão.

Olhar para as matas que circundam Joinville, nesta época do ano, é se deliciar com a combinação das cores das flores, daquela que para mim é a árvore-símbolo da minha cidade, o jacatirão, que nestes meses de verão enfeita as ruas, os morros e matas com suas flores brancas, rosas e lilases.

Por coincidência ou não, com o florescer do jacatirão a natureza anuncia a chegada de um tempo que nos leva a reflexões: o Natal e o Ano-novo!

Não sei se é impressão minha ou bairrismo, mas flores de jacatirão como as que temos em Joinville e arredores, enfeitando e caracterizando as festas de final de ano, não existem em nenhum outro lugar. Flores singelas, mas de vigorosa expressão, que traduzem a força da natureza que nos cerca e parecem trazer com seu viço a força do renascimento, características de final de ano, independentemente dos nossos sonhos, carências ou frustrações.

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Ferias

“Pega uma enxada e vai lá no bananal do Chico Feio pegar minhocas. Chama o Tinho e o Pinga pra ajudar, se é que eles querem ir pescar com a gente lá no trapiche da Stein. Já preparei quatro caniços e vamos ver se pegamos uns carás, que a vó Maria tá com vontade de comer. Às quatro, vai ter futebol no campo do areão, daí a gente aproveita e bate uma bola”, disse o Gordura, com a autoridade de irmão mais velho.

Esta era uma época feliz para nós, crianças. Dezembro. Férias. As ruas do Bucarein ficavam alegres com as algazarras e brincadeiras. Pescar no trapiche da Stein, jogar futebol no areão, brincar de pega-pega, jogar taco, peca (bolas de gude), pião, andar de bicicleta ou brincar de se esconder nos depósitos de madeira da Brandt e da Gugelmin, no tempo em que madeira era pinho e não pínus, era o que se fazia para passar o tempo. Os pais ficavam despreocupados, e a um assovio a gente já se apresentava continente. Sempre tinha uma mãe para nos oferecer uma fatia de cuca ou uma bolacha “mata-fome” com capilé de groselha e já estávamos pronto para uma nova brincadeira.

A Gastão de Vidigal, a rua da minha infância, numa época de chão batido, valetas abertas, poeira, chafariz na esquina com a rua Laguna, postes de madeira, enchentes na lua cheia e quando tinha as marés de sete anos, a fábrica da Ambalit, o trem que nos dava carona até o moinho, em cujo porto atracavam os navios Catarina e Urbano, as cegonheiras descarregando Rurais, Aero Willys e Gordines no terreno onde está hoje o Colégio Celso Ramos, fervia e vibrava com o Xande, Gordurinha, Tota, Nato, Babi, Tinho, Ninho, Dil, Dido, Pirulito do Chico, Carijó, Serginho Shereda, Cláudio, Xuxu, Pinga, Sapo e muitos outros.

Andar na Gastão agora é triste, pois as férias começaram e a gente não vê algazarra na rua. Hoje, são Gabriéis, Anas, Letícias, Rosas, Vitórias, Giselis que não interagem mais com o lúdico, com o criativo. Não correm, não sacaneiam as outras crianças, não põem apelidos.

Novos tempos sem o assovio dos pais, mas com bolachas recheadas, chips, refrigerantes, video game, computador, internet e Facebook.

É, como diz meu amigo Tinho (Orestes João dos Passos), tudo muda, mas os que viveram naquela época, de certeza, viveram momentos mais felizes.

terça-feira, 29 de novembro de 2011

Vereadores

Para as próximas eleições, as câmaras municipais das cidades brasileiras já terão votado suas leis para aumentar ou não o número de vagas para vereadores. Em Joinville, os defensores do aumento alegam que a cidade passa a ter mais representatividade, que dificultaria a ação espúria do Executivo, pois terá mais gente para fiscalizar.

Os contra se atêm aos custos decorrentes deste aumento e alegam que não existe trabalho para tanta gente. Que se for para ficar dando medalha de honra ao mérito, título de cidadão, nome de rua, fazer assistência social com o dinheiro dos outros ao invés de legislar e fiscalizar, que permaneça como está.

Todos os dias escutamos e lemos sobre pretendentes a candidato, tanto para prefeito como para vereador. Como prefeito não tem jeito, tem que ter mesmo, temos que discutir a ampliação do número de vereadores.

Outro dia meu camarada Gordurinha, que já estava, como se dizia no Bucarein antigo, com a “bucica” (cadela feia ou mau humor), pois tinha que cortar a grama da casa, afinal o Natal está chegando e esta tem que ficar “tinindo”, me falava: “Já que a gente tem que votar para vereador, decidi: vou votar em quem nunca se elegeu. Vou escolher um marreco qualquer, porque acredito que a renovação pode dar nova feição ao que está posto. Se esta turma que está aí não resolveu, vou mudar”. “Mas os caras novos entram sem saber nada”, disse eu. “Que bom”, respondeu. “Eles aprendem logo e sem os vícios dos velhos e, se forem sérios, farão diferente.”

Continuou: “Digo mais: agora está na hora de fazer caixa para a campanha do ano que vem. Imagina o prato cheio que é definir plano diretor, alteração de zoneamento, passagem de ônibus e zona azul. E tem mais, se eu fosse um bruxo e tivesse uma varinha de condão, daria um click na cabeça dos empresários, de todos os tipos, para que eles negassem todo e qualquer dinheiro para financiar campanha. Afinal eles financiam para quê? Com qual interesse?

“Deveriam deixar a galera se espremer. Cada um por si. Pelo que vale. Pelo que fez pela sua comunidade. Gente mais engajada e com vontade de ajudar a cidade e não de se locupletar. Não precisamos de mais quantidade e, sim, de mais qualidade.”

Falou, Gordura, vou na tua! Abaixo a reeleição!

terça-feira, 22 de novembro de 2011

Repasse

Se o que li no jornal, na reportagem “Nova lista libera mais dinheiro a mais entidades” é verdade, a coisa, em Joinville, está mesmo feia e na contramão.

Diz no “AN” de 3/11/2011 “O presidente da Câmara de Vereadores, divulgou aquela que deve ser a lista completa dos 60 órgãos e entidades que vão receber as sobras de recursos do Legislativo. “Todo o mês, a Prefeitura faz o repasse constitucional à Câmara, que não consegue gastar todo o dinheiro. Essa sobra vai ser repassada agora às entidades. O dinheiro será devolvido ao Executivo, que vai depositar nas contas das entidades indicadas pelo Legislativo. Cinco entidades que apareciam em setembro não estão formalmente na nova relação, mas vão receber o repasse mesmo assim”. Pelo escrito no jornal, elas não teriam como conseguir documentação para obterem os repasses e irão recebê-los por meio de outra entidade. “Isso justifica porque esta receberia apenas R$ 10 mil em setembro e agora vai receber quase dez vezes mais (R$ 98 mil)”, completa o texto.

Como a gente diria no Bucarein antigo: isto é sarrafo pra bater em maluco! Desde quando vereador é eleito pra distribuir dinheiro a entidade que não tem documentos, o que supostamente está ilegal, pode receber verbas públicas por meio de outra?

Lendo a Lei Orgânica do Município, vemos que os verbos conjugados para os vereadores são: legislar, deliberar, votar, autorizar, criar, extinguir e delimitar. Em nenhum lugar se conjuga o verbo distribuir. Mostrar o destino de recursos do município, até ordem em contrário, é função do Executivo e não do Legislativo. Neste opróbrio, fico com o vereador que diz, na mesma matéria, “que mantém a posição de que faltou pulso forte ao prefeito em autorizar a forma de repasses sugerida pelo presidente do Legislativo”.

Lendo a reportagem e analisando este imbróglio, vejo com que facilidade alguns políticos se apropriam das coisas públicas, como se suas fossem, e na maior desfaçatez se transvestem de Robin Hood, como se morassem na floresta de Sherwood e as distribuem, para colher os frutos em nova eleição. Dá uma sensação muito ruim ver estes atos e, pior, ver as forças vivas e fiscalizadoras do município aceitarem e ficarem quietas!

terça-feira, 1 de novembro de 2011

Herondina

Num sábado qualquer de 1968, saímos Zé Carlinho, Pinga e eu para uma noitada de serenata. Violão debaixo do braço, que os dois tocavam muito bem, atravessamos a noite cantando para meninas conhecidas. Era a primeira vez que o Zé saía à noite (tínhamos nossos 16 anos). Lá pelas cinco da manhã, voltávamos pela avenida Procópio Gomes em direção ao bar do Chico do Ernesto, meu pai, que abria neste horário, para tomar um Choco Leite, avisá-lo e, após, ir para a Enseada curtir o domingo. Faltava uma quadra para chegar quando avistamos a dona Herondina vindo em nossa direção. O Pinga logo falou: “Ih Zé, ferrou!”.

Ela agarrou o Zé e saiu arrastando-o e nós, claro, atrasamos o passo, pra não sobrar, também, para as nossas orelhas.

Ao chegarmos ao bar, meu pai disse: “Te prepara, marreco, que a tua mãe vai te pegar”; “Por que, pai?”; “Vocês foram pra bagunça e levaram o filho da Herondina junto. Desde as duas da manhã ela vai lá em casa, de meia em meia hora, e acorda a tua mãe para saber se vocês já chegaram – naqueles tempos não tinha celular. A Nilza tá uma fera!”.

O Zé não estava acostumado a madrugar e nem a dona Herondina a vê-lo chegar àquelas horas. “Oh, pai, nós vamos pegar o zarcão e vamos pra Enseada. Vê se amansa a mãe”, falei. Não adiantou. Na volta, escutei um bocado. Joinville teve e tem muitos bons professores e, ao contar a história acima, me lembrei de uma que me traz grandes lembranças.

Falo de Herondina Vieira, a inoxidável, que permanece, aos 92 anos com aquele brilho característico no olhar, penetrante e especial. É uma história de 45 anos de magistério em Joinville que deve ser sempre contada e reverenciada.

Várias histórias permeiam a vida desta mulher. Histórias de alegria, como a formatura dos seus quatro filhos, expoentes em suas profissões e de grande sofrimento, como a ida para o oriente eterno do seu Leléu e do filho Tonico, mas que nunca a fizeram desistir da vida nem de sua fé inabalável. Segundo ela, “a fé é uma palavra que tem duas letras, o ‘f’ de fazer e o ‘e’ de esperança”.

Uma professora, na expressão da palavra, que teve como objetivo único de existência: ensinar, dar carinho, atenção e apoio. Obrigado, dona Herondina, pelo exemplo de vida!

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Steve

Outro dia, faleceu Steve Jobs e li, numa crônica, que “poucas pessoas transformaram tanto nosso modo de viver nos últimos dez anos quanto o fundador da Apple. Sua vida é um baú de lições a todos nós”.

Talvez por eu ser jurássico e o computador, para mim, um acessório de sofrimento obrigatório e não ser muito ligado em hardware, o cara da minha mente é o Bill Gates, o do software. Até porque quando o Windows dá problema é ele que a gente xinga.

Mas a morte do Steve deu muito ibope. Esteve presente em todas as televisões, rádios e jornais com várias frases de efeito, filosoficamente bem elaboradas.

Pensei comigo: este sujeito deveria ter sido mais bem aproveitado. Deu-me até vontade de comprar um notebook da Apple, mas um amigo me disse que o sistema é diferente do do Windows. Daí é demais para minha cabeça. Já chega quando tive que abandonar a minha máquina Olivetti e esquecer as aulas que tive na Escola Nelson Miranda Coutinho, a escola de datilografia de Joinville. Agora nem datilografia é. É digitação. Tudo por causa do Steve.

A minha geração passou por esta transformação. Lembro-me das aulas de física I, como calouro de engenharia civil em 1971, aprendendo a calcular com régua de cálculo. Ganhei a minha, uma Faber Castell, do Gordurinha, que estava se formando em engenharia mecânica, primeiro curso da Udesc Joinville. Tirava-se tudo ali: raiz quadrada, cúbica, logaritmo, seno, tangente. Era o máximo.

Em estatística, usava-se para calcular aquelas Olivetti de manivela. Em computação, a linguagem que aprendi foi Fortran. O computador da escola era do tamanho de uma sala de aula. A gente fazia programa e passava para um cartão perfurado que ia para a leitora do computador. Em 1985, vi o primeiro PC no meu curso de mestrado, em Niterói. Deve ter sido um Apple. De lá para cá, a coisa não parou mais.

Fico imaginando quantos “Steves” vivem aperfeiçoando estas máquinas maravilhosas que transformaram e transformarão os próximos anos com mais velocidade e tendo o céu como limite. Dou risadas ao lembrar que todos os dias, depois do almoço, ficávamos, eu e meus irmãos, aprendendo código Morse com o Chico do Ernesto, que foi radiotelegrafista do Exército na Segunda Guerra Mundial e que não cansava de repetir: “Radiotelegrafista é a profissão do futuro!”

terça-feira, 4 de outubro de 2011

Tipos da cidade

Outro dia, fui a um enterro de um ex-aluno, jovem engenheiro civil formado da nossa Udesc Joinville, e encontrei o Vicente do Loló, amigo de infância e frequentador assíduo do mercado público. Fazia muito que não o via e acabei encontrando-o naquele ambiente triste.

“Este prefeito que está aí não é de nada. Bom era o Freitag”, começou ele a prosa e logo em seguida me “mordeu” uns trocados. O Vicente sempre foi assim, entendido em política e, se você “der corda”, ele fica horas definindo os políticos desta nossa Joinville.

Ao ele ir embora, fiquei matutando sobre ele e outros tipos que a cidade já esqueceu. Tipos da cidade afeitos a serem vítimas de chacotas, de gozações e, não raras vezes, de compaixão.

Logo me veio à mente o Donato. Nos anos 1960/70, todos que frequentavam o Mercado Público o conheciam. “Donato, vai à missa sem sapato!”, gritava um gaiato, e ele, que diziam ter sido goleiro do América, soltava impropérios aqui impublicáveis.

A Negra Emília era inconfundível, empurrando seu carrinho de mão e vestida como homem, vagando entre o bar do Chico do Ernesto, na Procópio Gomes, e a avenida Cubas.

O Laranjinha, no Centro da cidade, fumando cigarro com a brasa dentro da boca e filtro no lado de fora era uma atração, assim como era o Bananeira, que embriagado adorava discursar e não contava tempo para sair agraciando com xingamentos a mãe de quem o contestava.

A Rosa do Pé Inchado era outra figura conhecida. Perambulava pela rua do Príncipe com aquelas trouxas características, uma de bugigangas na mão e outra, de pano, enrolada e protegendo o pé inchado. Daí o seu cognome.

Por último me lembrei do Chico Sapo, o “Chiquinho da Mamãe”, sempre bem vestido, limpo e cuidado pela respectiva. Adorava discursar, mas, quando ficava irritado com alguém, logo dizia, sem perder a classe: vai-te às fezes!

Se me perguntassem para quem deveríamos erguer monumentos, eu não hesitaria, abrindo a cortina do tempo, um só momento em eleger estas figuras. Cada qual representando uma época, um assunto e um espaço. Estas pessoas foram atropeladas pela pressa destes novos tempos, mas não serão apagados de minha mente como tipos da minha cidade.

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Minhaville

Aqui nasci, cresci e, se tudo der certo, aqui serei enterrado. Joinville é a terra de meus avós, de meus pais, de meus filhos e de meus amigos. Lugar de se viver, trabalhar e ser feliz. Muitas coisas têm mudado nesta cidade, algumas para melhor e outras para pior, mas ela continua sendo o meu oásis.

Estudei no Rui Barbosa, no Bom Jesus e na Escola Técnica Tupy, no tempo em que era de graça. Época de poucas ruas calçadas e, todas, com paralelepípedo. Ônibus só ia do final da João Colin ao Km 4. Bicicleta era comum, e carro, para quem podia, era Simca, Gordini e DKV. Tinha pelo menos um Morris preto, do tio Niralci Sant’Anna, que era funcionário do BB, sonho de quem queria ser alguém na vida.

Bolacha era “Maria”, da Padaria Born da Getúlio Vargas. Macarrão se comia aos domingos com maionese feita em casa, acompanhado de Gengibirra. Merenda era bolacha mata-fome. Café era Moka, da Stein. No Tilp, se comprava de tudo. Verdura se comprava do seu Oge, que vinha de carroção lá de Pirabeiraba.

Domingo era dia de missa com o padre Érico, na Sagrado Coração de Jesus, e, depois, do programa do Fausto Rocha no Cine Palácio. À tarde, matinê no Cine Colon e salada de frutas com nata na Polar. Chineque era da Brunkow, e empada no Jerke (sobrevivente). Chop era no Sopp da João Colin e cuba, no braço de Ouro. Pontos de encontro dos que faziam faculdade fora de Joinville.

Nos tempos atuais, Joinville passou a ser a Buracoville para os pessimistas e Nossaville para os ufanistas que, a meu ver, não separam as coisas boas das ruins e parece que tudo virou política. A Minhaville é muito maior do que os pessimistas e ufanistas enxergam. É preciso amar o lugar onde se vive e saber que não é pela discussão em jornais entre pessimistas, ufanistas, céticos ou cínicos que resolveremos nossos problemas.

O modo como encontraremos alternativas para os desafios desta época depende das perspectivas presentes, do nosso imaginário e dos recursos intelectuais de que dispomos. Necessário ter, também, dirigentes sonhadores e criativos, que suem a camisa para realizar os anseios da população. O desenvolvimento das cidades é influenciado pela cultura e força de trabalho do seu povo, e isto nós temos de sobra, independentemente de quem esteja encastelado no paço municipal.

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

CAPRICHO

Antes de sairmos de casa para ir para a escola nossa mãe nos enfileirava, eu e meus irmãos, para ver se o uniforme escolar estava limpo. Fazia questão de que chegássemos, ao Grupo Escolar Rui Barbosa, luzindo. Era capricho.
Capricho com a roupa dos filhos, com suas casas, deixando-as confortáveis, simpáticas e preparadas para qualquer ocasião era uma tônica joinvilense. Sempre ouvi de minha mãe: não somos ricos, mas nem por isso devemos deixar de ser caprichosos. Naquela época a gente usava calça Brim Coringa, comprada nas Pernambucanas, camisa de chita feita em casa e sapato Passo Doble. Mas existia capricho ao se vestir, não monitorado por grifes, mas sim pela limpeza e por roupas bem passadas. As minhas pela vó Maria, que fazia questão de fazer os vincos nas calças, com seu ferro de passar, aquecido a carvão.
Roupas limpas e passadas, unhas cortadas e limpas, educação ao falar, honestidade nas atitudes, personalidade, respeito e bom humor, são sinônimos de cuidado e atenção, ou seja, de Capricho.
Há 50 anos as ruas de Joinville eram calçadas com paralelepípedos bem assentados, arborizadas, as casas tinham belos jardins, eram pintadas e suas calçadas eram varridas. Dava gosto andar por elas. Capricho dos moradores.
A cidade foi formada por empreendedores que a colocaram no mundo, vitoriosa. Puro capricho.
Adoro flanar pelas suas ruas centrais aos sábados de manhã, pois o movimento das pessoas caminhando (encontrando amigos, distribuindo abraços e tudo bem contigo e com a tua família?) sempre me satisfez.
Sábado passado fiz isto! Andar pela rua XV, coração da cidade, foi frustrante. Cortaram as árvores e deixaram os tocos. A calçada, de pedras portuguesas, totalmente descaracterizada e irregular e com coisas querendo nos fazer crer que são floreiras.
Para encerrar fui dar uma olhada na nova urbanização da JK. Pois não é que amarraram os pontaletes da cerca central com arame aos postes e pior, nem uma árvore escapou. Amarrar a cerca em uma árvore, que teimosa insiste em permanecer no meio do canteiro é demais!
Fazer bem ou mal feito custa a mesma coisa. Aliás, na maioria das vezes fazer mal feito custa mais caro. Lembrando minha mãe: ninguém precisa de muito dinheiro para fazer bem feito. Só precisa capricho!




quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Brasilidade



Conversava com meu amigo Gordurinha sobre essas histórias dos rolos nos ministérios. Seis meses de governo e uma avalanche de denúncias. Com ministros caindo, assessores presos e deputados alvoroçados trocando indignação por emendas parlamentares e dizendo não à faxina propalada pela presidente, imagino que as denúncias tenham base em verdades. É muita cara de pau e sem-vergonhice. Então, ele me disse: pior é que nem atirar pedra se pode, pois o nosso povo é assim. Reclama, fala mal, mas quando come melado se lambuza. Não falta educação científica e tecnológica, falta é educação moral e cívica. Falta chicote. E ficará pior, pois hoje nem puxão de orelha uma mãe pode dar num moleque sacana.

Outro dia, diz o Gordura, recebi um e-mail que dizia: “Cidadania deve ser atitude praticada o tempo todo, em todas as situações, não apenas quando reclamamos, genérica e abstratamente, do País como um todo e dos políticos de maneira particular”. Reclama-se dos vereadores, prefeito, governador, deputados e presidente e, no entanto, o brasileiro coloca nome em trabalho que não fez; o nome de colega faltante na lista de presença; paga para fazerem seus trabalhos escolares; saqueia e faz festa com cargas de veículos acidentados; tenta subornar quando é pego cometendo infração; troca voto por areia, tijolo e até dentadura; trafega pelo acostamento num congestionamento; faz filas triplas em frente às escolas; dirige bêbado; fura filas se fazendo de desentendido; pega atestado médico, sem estar doente, para faltar ao trabalho; faz “gato” de luz, de água e de tv a cabo; a serviço pela empresa, gasta 10 no almoço e pede nota fiscal de 20; vende objetos doados em campanhas de catástrofes; acha-se esperto ao comprar produtos roubados por preço baixo; leva, das empresas onde trabalha, clipes e canetas, como se não fosse roubo; comercializa vale-transporte e refeição que recebe da empresa; recebe troco a mais e fica quieto, mesmo sabendo que quem vai pagar é o caixa, etc.

E queremos que os políticos sejam honestos? Daí pergunto: o brasileiro é assim por causa dos exemplos dos políticos, ou os políticos são assim por causa da brasilidade? De uma coisa tenho certeza, meu amigo: enquanto o povo não mudar o jeitinho esperto, agindo com educação, honestidade, dignidade, ética e respeito a tudo, a coisa não mudará! Estaremos sempre vendo estes escândalos e, pior, se acostumando com eles!

domingo, 7 de agosto de 2011

Por do sol

Outro dia, reclamava para um amigo que meu filho tinho ido morar na Austrália. Então ele, que perdeu um filho de 20 anos, me disse: reclamas do que? Podes pegar um avião a qualquer hora e ir lá dar um abraço nele. Demora mas chega!
E eu? Que digo eu que nunca mais verei o meu?
Peguei o avião e fui!
Com mochilas nas costas, mochileiro ou backpacker, como é denominado quem viaja desta maneira, fomos passar sete dias no norte daquele país, em Whitsundays, mais precisamente em Arlie Beach. A idéia era conhecer as barreiras de corais existentes naquela região.
Em um veleiro, espanhois, alemães, holandeses, ingleses e tres brasileiros, ficamos tres dias e duas noites no mar, curtindo o amanhecer, mergulhando durante o dia e apreciando o anoitecer. Confesso que mergulhar, para mim, foi o mais dificil, mas confesso, também, que a beleza daqueles corais e dos peixes existentes neles faz superar qualquer frio e medo que se possa ter.
Nos finais de tarde o barco parava na sombra de uma ilha, para evitar qualquer vento e de lancha íamos para a praia, onde sentavamos na areia e, maravilhados, curtíamos o por do sol.
Passamos momentos inesquecíveis juntos, eu, meu filho Diego e um amigo, Eduardo Gardenal, nascido em Bragança Paulista e que está por lá, também, fazendo a vida. Mais um dos “brasucas” que buscam esperanças e vida melhor em outras plagas.
A representação da imagem do sol se pondo no mar, abraçado ao Diego, foi emoção pura! Deixou minha alma preenchida, em estado de graça e absorvida por extrema calma.
Lembrei-me do meu amigo e da sua dor!
Lembrei-me de muitos amigos e de seus filhos!
Lembrei-me dos meus outros dois filhos!
Lembrei-me da Albertina e do significado da letra de uma das suas canções preferidas: Epitáfio dos Titãs. “Devia ter complicado menos; Trabalhado menos; Ter visto o sol se pôr”. “Devia ter me importado menos; Com problemas pequenos; Ter morrido de amor”.
Agradeci ao Grande Arquiteto do Universo por ter me proporcionado aqueles momentos e ao meu amigo que, da sua frase eivada de dor, me abriu os olhos para que eu pudesse ter o deleite de curtir o por do sol ao lado de meu filho!

quinta-feira, 28 de julho de 2011

Austrália

36 horas de viagem e estou na Austrália. A gente ouve muito falar dela e, como meu filho Diego, assim como muitos filhos de brasileiros que procuram um lugar melhor para fazer a vida, vive aqui, vim conferir. Segundo conta a história, a colonização da Austrália pelos ingleses começou com o objetivo de esvaziar as cadeias superlotadas da Inglaterra.

Com a independência dos Estados Unidos, ela teve que parar de mandar condenados para a América e começou a enviá-los para a nova terra conquistada. A primeira frota, com 11 embarcações e aproximadamente 1,3 mil pessoas, organizada para colonizar o continente, atracou em terras australianas em 18 de janeiro de 1788, e durou como colônia penal até 1868.

Sabe aquele ditado que a gente está cansado de ouvir? O Brasil é novo ainda! Cai por terra quando vejo um país com pouco mais de 200 anos de idade, ou seja, com menos da metade da idade do Brasil, teoricamente em níveis tecnológico e industrial semelhantes ao nosso, apresentar excelentes resultados, comparados internacionalmente, em relação à saúde, expectativa e qualidade de vida, desenvolvimento humano, educação pública e segurança. A Austrália está entre os países com melhores índices de desenvolvimento humano do mundo e suas cidades situam-se entre as melhores em termos de habitabilidade, oferta cultural, mobilidade, acessibilidade, ou seja, em qualidade de vida.

Sydney, a cidade em que estou e onde começou a Austrália, tem hoje em torno de 4,5 milhões de habitantes e me deixou impressionado pela beleza, estrutura e planejamento urbano. Uma cidade espalhada, arborizada, com edificações baixas e algumas áreas concentrando altos edifícios. Avenidas largas e trânsito fluindo fácil. Extensas áreas verdes em parques enormes. Transporte marítimo, trem, VLT, táxis, ônibus em suas faixas, ciclistas com capacetes obrigatórios, em ciclovias e calçadas amplas, fazem a acessibilidade e a mobilidade ficar muito fáceis.

Como diria meu amigo Gordurinha: um show. A pergunta que me corrói é: como um lugar que foi formado por prisioneiros deportados, em 200 anos construiu um país organizado, estruturado, sério e de belas cidades e nós, no Brasil, em 500, agraciados por Deus com uma terra maravilhosa e que tem de tudo, não conseguimos sair deste marasmo?

quarta-feira, 13 de julho de 2011

Sydney........

Histórias do Bucarein

“Não gaste velas com mau defunto” era um dos ditados que o Chico do Ernesto nos falava quando a gente ficava remoendo impropérios contra alguém que nos desaforava. Ele adorava nos ensinar por aforismos.

Mas legal mesmo era escutar as histórias que ele e outros frequentadores do seu bar, como Ronald Kavanach, Jacaré Diniz, Tavinho Carsten, Nenê Castelhano, Nêgo Alemão e Caneta, contavam sobre suas infâncias vivenciadas nos primórdios do bairro. Histórias passadas no Bucarein às margens do Cachoeira, no tempo em que suas águas eram límpidas e serviam de regalo para refrescantes mergulhos da meninada.

Outra boa lembrança que trago daquela esquina da Procópio Gomes com Plácido Olímpio é a dos sambas cantados pelos frequentadores e, principalmente, do som mágico do bandolim tocado pelo falecido Bera, acompanhado do Loli, no violão de sete cordas, e do Nêgo Buião, no pandeiro. Ainda sei de cor vários sambas que aprendi com aquelas pessoas simples e felizes, como Emília, Helena e Amélia, tocadas e cantadas entre um gole e outro de uma gelada “faixa azul” da Antarctica, e da degustação de “Jabiru” e “Colonial”, as cachaças da época.

As rodas de samba eram sempre às sextas-feiras, depois das seis da tarde, horário em que chegavam os estivadores: Melão, Bileca, Antonio Mendingo, Arriola, Barata e Baratinha, Nano Tartaruga, Zé Castelhano e muitos outros, para receberem o pagamento das mãos do Chico por terem trabalhado a semana inteira carregando as embarcações (conhecidas como chatas) com madeira.

Depois de receberem o pagamento, se deleitavam em boa conversa e dava gosto vê-los sorverem alguns lisos e mercedinhos da “maldita”, como era chamada a cachaça, acompanhados de sardinha frita, siri ao bafo, ou mesmo de uma morcilha preta fatiada.

Nós, filhos da terceira geração do Bucarein (nascidos entre 1945 e 1960), crescemos no meio destes homens, hoje esquecidos, que ajudaram a fazer a história do bairro e de Joinville.

Hoje, quando volto a caminhar por ali, me dá saudade daquela infância sadia e fico pensando: que pena que as crianças e jovens de hoje não têm mais o Chico, nem os contadores de casos, nem os estivadores, nem o porto, nem as madeireiras, nem o rio limpo. De certeza, fomos mais felizes.

terça-feira, 28 de junho de 2011

Liberdade de expressão

“A questionada e tão reprimida Marcha da Maconha é a evidência de como se interconectam os direitos constitucionais, todos merecedores do amparo do Estado. As autoridades, longe de transgredi-los, tinham que protegê-los, mostrando tolerância e respeito por quem está em espaço público pretendendo transmitir mensagem de abolicionismo penal”, afirmou Celso de Mello (Diário de Pernambuco.com.br).

O Gordurinha é demais. Dia destes, encontrei-o sorrindo. Estranhei, pois ultimamente só o encontro acabrunhado e reclamando das coisas que acontecem no Brasil de hoje. O que é que houve, Gordura, para estares tão radiante?

– Meu irmão, estou salvo. Eu já andava meio com medo de sair na rua. Manja a tal da síndrome do pânico? A minha sorte é que converso comigo mesmo e faço a catarse das neuras. Sabes como é, sou branco e heterossexual, e ainda por cima adepto da tradição, família e propriedade (TFP). E sabes, também, que se nos manifestamos, logo somos tachados de politicamente incorretos, racistas, homofóbicos ou neonazistas. Lembras daquela minha camiseta que tenho, escrito: “Hetero e 100% Ariano” e que nunca usei por medo de ser chamado de homofóbico e racista? Rapaz, agora vou poder usar!

– Estás louco, Gordura, vai dar rolo!

– Nada. Não vistes a resposta do Supremo ao pedido de liberação da Marcha da Maconha? O relator foi claro: defendeu que o Estado tem a obrigação de proteger a liberdade de expressão e que jamais deve interferir nesses direitos, garantidos pela Constituição. É livre a manifestação do pensamento sobre qualquer assunto. Foi taxativo: “Nada se revela mais nocivo e perigoso do que a pretensão do Estado de reprimir a liberdade de expressão, principalmente de ideias que a maioria repudia. O pensamento deve ser sempre livre”. Afirmou, também, que a polícia não tem o direito de intervir em reuniões pacíficas e lícitas em que não haja lesão ou perturbação da ordem pública. “Longe dos abusos que têm sido perpetrados pelo aparato policial, é preciso adotar medidas de proteção aos participantes, os resguardando das tentativas de oficiais e particulares de desmanchá-las.” Tu não achas que se serve para a “esquadrilha da fumaça”, serve, também, para todos os outros casos? Este ministro é o cara! Tirei a camiseta do armário e já pedi para a “nega” dar um trato, pois vou usá-la sem fobia!

quinta-feira, 16 de junho de 2011

Azaleias

Existem certas coisas que não há como entender. Parecem coisas de quem não tem o que fazer ou de gente que está com as ideias fora do lugar.

Passar na avenida JK e ver as retroescavadeiras retirando as azaleias foi de doer. Quando a gente pensa que o estoque de sandices esgotou, pimba: lá vem um iluminado da Prefeitura com uma nova. Tenho que reconhecer que quem está “cuidando” de Joinville tem se superado diariamente.

Na imprensa, leio que o projeto é uma forma de revitalizar a via e torná-la mais arejada; que o trecho é escuro e fechado por causa das árvores e da altura das azaleias. Querem dar uma cara nova à avenida, por ser uma das principais de Joinville.

Só pode ser gozação. Trocar uma cerca viva, que vem cumprindo a sua função há anos, por uma de ferro, e as flores permanentes da azaleia por flores de época induz claramente a desperdício de recursos públicos e a um conceito do construir o espaço urbano desprovido de lógica e de fundamentação teórica e prática.

A azaleia é conhecida pela sua resistência à poluição do ar, portanto, adequada àquele local que tem intenso fluxo de veículos e está ali há anos formando uma cerca viva, protegendo os motoristas no encontro das luzes dos veículos, impedindo a travessia de pedestres por lugares impróprios, purificando o ar pela fixação de poeiras e fotossínteses de gases, reduzindo a velocidade de ventos, favorecendo a infiltração de água no solo, servindo de abrigo à fauna e amortecendo ruídos. Enfim, exercendo uma função ecológica, no sentido de melhoria daquele ambiente urbano, e estética, no sentido do embelezamento daquela via pública e, consequentemente, da cidade.

Então, por que cortá-las? Pelo que se lê, para substituí-las por plantio de flores de época, baixas e coloridas, e instalação de cerca de ferro a um custo de R$ 186 mil.

Para quem alega ter uma prefeitura sem recursos e endividada, mexer no que está quieto, fazendo obra deste tipo, ainda mais sabendo que se criarão novas despesas, visto que flores de época trocam-se de quatro em quatro meses (o canteiro da JK tem em torno de 1.050 m² que terão perto de 21 mil mudas a cada troca), há uma baita incoerência. Parece até que o prefeito procura fazer alguma obra, só para dar “satisfação” aos joinvilenses bocudos que ficam dizendo que ele não faz obra nenhuma.

terça-feira, 31 de maio de 2011

Neco Harger

Tem gente que nos dá muita tristeza quando se vai. Todos sabemos que nos separaremos um dia, mas a gente vai tendo consciência plena disto quando estamos margeando os 60 anos. Digo isto porque, nos dias de hoje, é por aí que começam a ir embora os nossos amigos e, daqui a pouco, nós mesmos.

Outro dia, longe de Joinville, como faço sempre, li o “AN”. Sempre leio tudo, inclusive, talvez por estar virando sessentão, o obituário. Quando novo, achava engraçado quando via o Chico do Ernesto, meu pai, lendo esta parte do jornal. Hoje, já não acho mais. Virou rotina.

Enquanto não somos nós, os que se vão nos deixam com as saudades de todas as conversas jogadas fora, das boas risadas, dos momentos compartilhados, da divisão dos sonhos de salvar o mundo, das lágrimas choradas, das angústias divididas, enfim, de todos os momentos vividos, bons e maus.

O que me faz refletir hoje, quando perco um daqueles amigos que não via há muito, pois estávamos separados por uma destas encruzilhadas que a vida nos apresenta, é a sensação do tempo de convivência perdido. Sabemos que o contato do olhar, do abraço apertado e da satisfação de ver o outro é insubstituível e, no entanto, a vida vai passando e nos esquecemos disso, e só vamos nos lembrar na hora da perda. Uma lástima, pois quando o outro se vai não dá mais tempo para manifestar o nosso prazer pela convivência mútua, só para lamentar.

Sabes aquele amigo que quando tu encontras teu ânimo aumenta? Aquela pessoa que está sempre pronta a te ajudar? Que sempre tem uma palavra amiga? Que transmite a felicidade ao te ver e que a recíproca é verdadeira? Uma destas pessoas, para mim, era o Neco Harger!

Meu amigo de juventude não era ele, era o Paulinho, seu irmão. O Neco era bem mais novo que nós. Nos nossos 17, 18 anos, quando vínhamos de uma noitada no Ginástico e íamos à casa dos pais dele “filar” um café com chineque, o Neco ainda estava dormindo, mas, como o tempo passa, ele cresceu! E no crescimento dele, formamos uma grande amizade.

Infelizmente, só soube da viagem depois de ela ter sido iniciada. Queria muito ter participado da despedida. Até um dia, meu irmão. Encontro-te no alpendre da morada do Grande Arquiteto do Universo.

terça-feira, 17 de maio de 2011

Factoides, por Anselmo Fábio de Moraes

Sábado desses, fui ao Mercado Público de Joinville dar um abraço no meu amigo Zé Ramos, barbeiro das antigas e dos bons e com cabelos brancos desde que eu era criança – e faz tempo.

Pra variar, encontrei o Gordurinha, que me perguntou: “O que achaste desta história de Bin Laden morto, mas sem o corpo?” Respondi: “Sei lá, parece factoide, já que o Obama anda meio em baixa nas pesquisas e ano que vem tem eleição”.

Factoide, segundo o “Aurélio”, quer dizer: fato, verdadeiro ou não, divulgado com sensacionalismo, no propósito deliberado de gerar impacto diante da opinião pública e influenciá-la, de forma a manipulá-la de acordo com as aspirações de grupos políticos, que se utilizam de sua influência na mídia. Considera-se também que pode ser uma afirmação improvável, que de tanto ser repetida acaba sendo aceita como verdade inquestionável.

E o pacotão do nosso prefeito? Da reativação da Secretaria de Serviços Públicos (SSP) e do fechamento das secretarias regionais?

Bom, disse eu, acho que a SSP nunca deveria ter sido fechada, pois fazia serviços importantes que foram redistribuídos entre outros órgãos, que não tiveram o mesmo desempenho, e reativá-la entendo como um acerto. Quanto às secretarias regionais, no governo Freitag, no qual trabalhei, eram braços importantes como apoio à Secretaria de Obras. Na época, o saudoso João Amaral era o gerente da Leste e não tinha “status” de secretário, mas elas funcionavam bem. Pelo que se lê, hoje, parecem feudos de grupos políticos, daí entendo que é um bom negócio voltar a ser o que eram. Além de que, acredito que tenha sido feito um grande estudo para ver o custo-benefício.

Li e reli o “pacotão de salvação” da Prefeitura anunciado pelo prefeito. Vejo ações boas e outras, como se dizia no Bucarein, coisas para encher linguiça. Em relação aos valores a serem economizados, R$ 10 milhões, me parece insignificante para uma prefeitura que tem um orçamento de mais de R$ 1,4 bilhão (menos de 1%).

Aliás, se é esta economia que vai resolver os problemas de Joinville, então a coisa está feia. Espero, sinceramente, para o bem de Joinville, que o pacote propalado não seja um factoide! Tomara, diz o Gordurinha, se despedindo.

quinta-feira, 5 de maio de 2011

O galo do João

Outro dia, li que “os vazios urbanos de Joinville devem render capítulos interessantes na discussão sobre a nova Lei de Uso e Ocupação do Solo”. Ao ler isto me lembrei do poema de João Cabral de Melo Neto, “Tecendo a Manhã”, que em parte diz: “Um galo sozinho não tece a manhã/ ele precisará sempre de outros galos”.

Leva-me o poema a pensar nas muitas discussões ásperas e míopes, sobre urbanismo, que se têm visto em Joinville. Pouco estudo e muito achismo, chegando-se ao cúmulo de se fomentar guerras entre as diferentes classes sociais, como se isto fosse o fulcro principal e não a desigualdade que impera na cidade como um todo.

Edificar a cidade baseado em dados e estudos profundos será muito mais saudável (uso do solo, ventilação, insolação, bem-estar da população) do que apenas ficar discutindo e disputando como se fosse um “cabo de guerra”, se deveremos verticalizá-la ou não ou mudando “rua a rua” o tipo de ocupação.

A impressão que se tem é que os galos não estão tecendo a manhã, mas, sim, concorrendo entre si: quem canta mais alto, quem é o mais bonito, quem empola mais o peito, e que se dane a cidade.

Pelo contrário, se o objetivo de quem a planeja é o bem comum, vislumbro que, para tê-lo, o trabalho deverá ser coletivo e solidário, utilizando-se da beleza do simbolismo do poema.

É imprescindível escutar todos os “galos” para traçar novos rumos para a cidade. É hora de definir objetivos e arregaçar as mangas, empenhando-se e caminhando na mesma direção. Mas só se conseguirá isto se os planejadores estiverem ávidos por ampliar saberes, compartilhar experiências e, acima de tudo, baixando o tom, desempolando o peito e voltando a atenção para o que está acontecendo ao derredor.

“Tecendo a Manhã” deve iluminar o pensamento dos que têm a obrigação de planejar a cidade e deixar claro que um galo sozinho não tece uma manhã”, muito menos o amanhã. E ainda não temos a cidade que desejamos, só tecendo juntos é que teremos a possibilidade de construí-la. Entendo que esta construção deve ser feita em coro, com harmonização das diferentes vozes e, principalmente, com a humildade dos gestores, que também têm a tarefa de cantar com os demais e sem desafinar.

Vereadores

Joinville discute, hoje, o aumento do número de vereadores. Sou totalmente favorável que se amplie para cem vereadores. Explico a minha teoria. A curva gaussiana pode ser aplicada em diversos fenômenos da natureza: altura de indivíduos, número de gotas que caem em uma chuva, níveis de colesterol de homens que bebem, e, inclusive, a taxa de acerto em formulação de leis feitas pelos vereadores. Quanto mais pontos (vereadores) eu colocar na elaboração da curva, mais representatividade a cidade terá e o acerto médio será maior. Óbvio, então, que quanto mais vereador tiver, mais a cidade será do jeito que a população quer.

Claro que tem o lado dos gastos. A Câmara vive do repasse constitucional feito pela Prefeitura. O salário dos nossos vereadores gira em torno de R$ 8 mil mensais e, segundo se lê, sobra um bom dinheiro ao final do ano. Imagino cem vereadores com o mesmo valor repassado hoje. Não aumentaria os custos e daria muito mais representatividade aos rincões da cidade. Antigamente, vereador era trabalho voluntário, no entanto, hoje é profissão que, além do bom salário, agrega assessores, automóveis e outras vantagens pecuniárias e sociais.

No “AN” de 5 de abril, lemos, entre outras coisas, que as entidades empresariais de Joinville estão se posicionando contra o aumento do número de vagas. A dúvida que me surge é se estão realmente preocupados com os gastos públicos ou com os seus. Explico! Se olharmos a prestação de contas de alguns edis, veremos quem financia suas campanhas. Pela lógica, mais vagas, mais candidatos. Mais candidatos, mais gente pedindo apoio e oferecendo facilidades. Consequentemente, mais gastos para quem financia. Sugiro que na próxima eleição as entidades empresariais não financiem ninguém. Cada um por si, do seu próprio bolso, pelo seu próprio talento, pelos seus próprios feitos e vamos ver no que dá.

Se forem cem dividindo o que ganham 25 (cada um receberia R$ 2 mil mensais como ajuda de custo, sem direito a carros, assessores e tendo como suporte a estrutura gerencial, comum a todos, existente hoje), teremos a população muito mais bem representada por pessoas interessadas na cidade e não somente em bons salários e na defesa dos interesses de seus financiadores.

Em minha opinião, não é o numero de vereadores o problema, mas, sim, a lógica do esquema posto.

Indignação

Outro dia, na saída de um supermercado, encontrei meu amigo de infância, o Tinho (Orestes João dos Passos), indignado. Perguntei o porquê e ele me respondeu: “Olha só, comprei R$ 48 e dei uma nota de R$ 50. Pois a caixa teve que fazer a conta na calculadora pra me dar R$ 2 de troco. Não é de ficar cabreiro?” E continuou:

“Lembra quando fizemos o curso primário? A gente aprendia o ABC, depois os números, decorávamos as tabuadas e, como consequência, aprendíamos a fazer as quatro operações, além de ficarmos horas e horas decorando os pontos (textos de geografia e história). Aprendíamos pela repetição, o que parece ser hoje pelas novas teorias pedagógicas um pecado. Hoje, ninguém sabe fazer uma continha sem uma máquina calculadora.”

Ficamos ali relembrando o tempo em que a gente vinha caminhando pela nossa rua, a Gastão de Vidigal (antigo prolongamento da rua Alexandre Schlemm), e passávamos pela Ambalit, Asilo Abdon Batista até chegar ao Grupo Escolar Rui Barbosa. Pois é, eu disse: “Hoje, essa gurizada nem sozinha anda mais.”

E as nossas professoras? Impossível não relembrarmos delas uma vez que foram as mesmas: donas Dulce, Laci Flores, Irecê, Carmen Dias, Maria Anísia e Clotilde Amin.

Outro dia, eu li de um pedagogo (naquele tempo, professora era normalista) que a aprendizagem significativa necessita de cinco componentes na ação cognitiva do aluno: memória, atenção, motivação, linguagem e emoção. Dizia também que um bom professor deve conhecer estratégias para poder trabalhar a memória do aluno, claro que não uma memória mecânica, repetitiva, mas uma memória com a qual o aluno contextualize, com a qual o aluno associe saberes novos aos que naturalmente ele possui. Deve saber trabalhar a atenção do aluno, descobrir fórmula para captá-la e, principalmente, motivá-lo.

Fatalmente, os nossos professores normalistas não conheciam estas teorias, pois faziam a gente repetir e decorar. Eram outros tempos, mas que funcionava, funcionava. Em uma época em que não existiam tantas teorias pedagógicas, televisão e nem se imaginava a internet, eles conseguiam fazer estarmos sempre motivados, interessados e aprendendo. Talvez porque tinham mais envolvimento e emoção.

Ainda indignado, ele disse: “Quem não sabe quanto dá 50 menos 48, duvido que lembre o nome das suas professoras!”

sexta-feira, 29 de abril de 2011

Uso do solo

Começa agora a discussão sobre a Lei de Uso e Ocupação do Solo que deve fazer parte do Plano Diretor de Joinville. Como esta é uma lei que irá interferir no dia a dia dos joinvilenses, é normal que os interessados, uns mais e outros menos, fiquem alertas às discussões.

Outro dia, li que um vereador disse que este processo levará a uma guerra, rua a rua, na definição do que poderá ou não ser feito em cada uma delas. Dentro do que se tem estudado, acredito que não se poderá deixar, no último momento, de se discutir rua por rua. Mas no último momento – e não como guerra!

Para iniciar a formulação da lei, tenho a convicção de que o processo deve começar analisando-se e entendendo-se o macro, ou seja, tendo-se a visão da cidade como um todo e pelo olhar de todos. Como queremos viver a nossa cidade no futuro?

Para responder a isto, teremos que definir nossos objetivos, baseados no conhecimento que temos de nossas deficiências e potencialidades e embasados no que os joinvilenses pensam e querem.

Provavelmente, serão sugeridas audiências públicas que não serão prestigiadas pela grande maioria e, por isso, sugiro, como vi em Barcelona, que se faça um questionário sobre os problemas que serão debatidos, para que todos recebam em casa e participem respondendo. Depois de tabuladas as respostas, se terá a direção do que a maioria deseja.

Observar a cidade como um todo pelo olhar da população e, após, traçar o que se deseja para ela, definindo para onde ela deve crescer, as ligações e os modais de mobilidade, de quais equipamentos urbanos necessitamos e o padrão de cada um, onde eles se situarão, onde ficarão as indústrias, o comércio, as residências e se verticalizamos e adensamos ou não.

Ter como primazia acabar com as desigualdades existentes entre os bairros, ou melhor, evitar que os bairros tenham categorias diferentes.

Se entendermos isto como base antes de começarmos a guerrear e retalhar a cidade, escorados no senso comum e não em vaidades e interesses pessoais, poderemos fazer uma ótima Lei de Uso e Ocupação do Solo.

Alguém vai contestar dizendo que isto é o óbvio. Peço desculpas pelo óbvio, mas entendo que as vaidades o escondem e é por meio dele que se pode ver muitas coisas que não enxergamos quando confiamos demais na nossa suposta sabedoria.

O pato

O Gordurinha, no Bucarein da minha infância, adorava sacanear a gurizada e, cada vez que gozava um, dizia: “Te liga, oh Pato – Quãck!”

Certa vez, estava azucrinando o Gê da Mariazinha, e este, para se livrar, disse: “Oh, Gordurinha, vai ver se estou lá na esquina!” O Gordurinha retrucou: “Vou. Preciso levar o cabresto?” “Para quê?”, respondeu o Gê, que era meio lerdo. “Pra te trazer, se estiveres lá! Quãck!”

Outra vez, deu uma pimenta-pitanga pro Ed do Nezinho, e este mordeu com tudo. Foi um berreiro só. E ele: “Quãck!”

O pato é um bicho estranho. É uma ave que sabe andar, voar e nadar, mas não é referencial em nenhuma das três coisas. O andar é desajeitado, nada devagar e mal voa.

No Bucarein, pato era sinônimo de trouxa. De tolo.

Outro dia, no mercado, encontrei o Gordurinha e ele me perguntou: “Tens lido os jornais?” “Claro”, respondi. Então ele me disse: “Lendo as notícias veiculadas sobre a nossa Joinville nos últimos dias, tenho a impressão de que, mesmo tendo a certeza de que não nasci para pato, estou sendo tratado pelos nossos políticos como se fosse um”.

Veja só, frases publicadas como:

Prefeito: “Somos um governo jovem, que busca o melhor para a população”. Quãck!

Vereadora: “Fomos enganados e não podemos aceitar esta questão do IPTU”. Quãck!

No livro sobre a história da Câmara de Vereadores de Joinville diz: “Depois de 160 anos, um afrodescendente ocupa o mais alto cargo do Legislativo”. Pois não é que ele renuncia ao cargo para assumir uma estatal de quarto escalão. Quãck!

Agora, como diz a galera: “Vamos combinar”. A foto do novo presidente da Câmara com os dedos cheios de chaves de carros penduradas e com um sorriso, misto de satisfação e ironia, afirmando: “Sem as restrições de horários para o uso do carro, o vereador poderá cumprir melhor as obrigações do seu mandato” me fez acreditar que, realmente, sou um pato. Quãck!

Adotei! Alguém me diz bom dia, boa noite, como vai? Eu, em protesto, estou respondendo: “Quãck! Quãck! Quãck!”

Em tempo: será que alguém vai devolver o dinheiro da reimpressão dos nove mil novos carnês de IPTU que substituíram os que foram cancelados? Quãck!

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Vacilo


Existem atitudes de políticos que não consigo entender, principalmente quando ele ainda é novo na lida e, provavelmente, tem um bom futuro. Imagino que para alguém se eleger a um cargo eletivo, tem que ter atrás de si uma estrutura, ser líder comunitário, aparentemente boa pessoa, trabalhador e inteligente. Acredito, também, que para se eleger ele precisa mostrar e provar, a quem nele vota, seus méritos e sua boa vontade em ajudar na construção do bem comum.

Normalmente apoiados por empresas, amigos, família, os políticos partem para uma eleição, que não é coisa fácil de participar e, muito menos, de ganhar. Entendo que estas pessoas, ao tomarem este rumo, o fazem por diletantismo, pois entendo a política como uma arte e não apenas porque estão atrás de emprego. Estão no processo porque querem se dedicar ao bem-estar comunitário, do próximo, mesmo que tenha que sacrificar o seu.

O que não consigo entender é o eleito, no início da carreira política e sem prestar o trabalho ao qual seus eleitores lhe confiaram por meio do voto, renunciar ao cargo eletivo para assumir um, de confiança e de menor importância, no Executivo.

Assumir uma secretaria de Estado depois de ter tido um cargo no Executivo, ainda dá para entender, pois pode levar consigo uma experiência já vivenciada e, possivelmente, poderá fazer mais pela população do que em um cargo Legislativo.

Mas quando uma pessoa se elege vereador e a seguir abandona o cargo para o qual foi eleito para assumir um cargo de terceiro escalão no Executivo, o que é que as pessoas do bairro que acreditaram nele vão receber em troca? Será que o cargo assumido no Executivo contribuirá com a sua comunidade de uma forma efetiva e eficiente? Ou será que servirá apenas como degrau num projeto de interesse meramente pessoal?

Quando assim o fazem, estes políticos jovens, vibrantes e de futuro se transformam em nomes novos com práticas políticas velhas. Quem assim age, a meu ver, comete um grande vacilo com quem nele acreditou e não tem, no futuro, o direito de choramingar.

Catilina


Sou um apaixonado por história, apesar de não ser um expert. Acho a história generosa e esclarecedora, pois, relatando os fatos acontecidos, nos dá excelentes lições.

Como tenho 58 anos, vivo pouco mais de um terço da história de Joinville, mas o suficiente para conhecer muitas das pessoas que ajudaram a fazer esta cidade. Nestes 160 anos de existência, Joinville conheceu uma plêiade de gente excelsa que se dedicou a ela com zelo, honestidade, inteligência e muito trabalho.

Fatos como a junção de dois grupos opostos para assumir a Câmara de Vereadores e seus melhores cargos e o que diz na coluna “AN Portal”, com a jornalista Rosane Felthaus (7/1), sobre o aluguel de carros para os vereadores: “Desta vez, haverá um modelo especial, um Vectra 2.0, que será de uso exclusivo do presidente. O mimo significa um aumento de R$ 5,2 mil na conta”, me levam a crer que, infelizmente, parece que os nossos políticos atuais não conhecem a história das pessoas que fizeram desta uma cidade pujante e séria.

Cícero viveu em Roma, onde foi filósofo, político e orador de enormes recursos, entre 106 a.C. e 43 a.C. Foi considerado uma das mentes mais versáteis da Roma antiga. Ficou famoso, também, por uma série de discursos que fez contra Catilina, um político da pior espécie, que sonhava com o cargo de cônsul. Estes discursos ficaram celebrizados sob o nome de “Catilinárias”, que foram usadas por muito tempo como uma das principais formas de ensino de argumentação, em todo o mundo. Mas, na sua frase mais célebre, é interessante observar que preferiu utilizar termos dos mais comuns e antagônicos ao seu falar normal. Esta frase ele vociferou para mostrar sua indignação quanto atos espúrios do opositor: “Até quando, oh Catilina, abusarás da nossa paciência?”

É interessante como algumas frases históricas, por uma razão qualquer, ganham raízes na memória da gente e permanecem sempre atuais. Passam anos e mais anos e, pelo que se vê, nunca faltarão Catilinas de maior ou menor envergadura. Parece que nunca nos livraremos deles e o pior é que cada vez há menos Cíceros.

Classe média


O ex-presidente da República Lula fez, em 23/12, seu último pronunciamento em cadeia nacional de rádio e TV. Entre tantas autovalorizações, disse: “Promovemos a maior ascensão social de todos os tempos, retirando 28 milhões de pessoas da linha da pobreza e fazendo com que 36 milhões entrassem na classe média”. Como os números divulgados, no Brasil, nunca batem com a realidade, fiquei encucado com a afirmação e, principalmente, com a definição do que se considera classe média.

A pesquisa “A Nova Classe Média”, divulgada pela Fundação Getúlio Vargas, diz que a pobreza diminuiu no Brasil. Segundo o estudo, a classe C, considerada a classe média no País, era de 51,89% em abril de 2008. Considerando o Censo 2010, existem no Brasil, aproximadamente, 190 milhões de habitantes, portanto, 95 milhões de pessoas estão nesta classe.

Acrescenta ainda que é classe média quem tem renda variando entre R$ 1.064 e R$ 4.591 (como na pesquisa não diz, imagino que seja rendimento bruto, portanto, ainda tem de se descontar os encargos). Mesmo que seja rendimento líquido, esta divisão me traz alguns questionamentos. Uma pessoa que ganha R$ 1.064 por mês (R$ 12 mil por ano) pode fazer o mesmo que uma que ganha R$ 4.591 (R$ 50 mil por ano)? Com R$ 1.064 por mês, pode uma família com três pessoas ter em termos de hábitos de consumo o que se vê pelo mundo afora nas classes médias: casa, carro, lazer, viajem nas férias, acesso ao sistema de saúde, filhos em boa escola, seguro de vida, poupança? As que ganham R$ 4,5 mil por mês, se tiverem vida regrada, talvez consigam, pois ganhar quatro vezes mais, nesta variação de valores, é uma diferença monstruosa.

Logo, pode-se deduzir que a faixa adotada para definir classe média não condiz com a realidade, me parecendo forçada, para que possa sugerir algo irreal.

Percebe-se pelos dados divulgados, em pesquisas, que houve avanços em termos salariais nos últimos anos. Porém, no meu entender, colocar pessoas na classe média com o valor R$ 1.064 por mês, que mal dá para pagar o básico para a sobrevivência (alimentação, remédios, luz, água, educação, aluguel, transporte) é devaneio apoiado em classificação e números forçados.

Novo ano, tudo velho


Estive pensando no por que da minha descrença com as festas de Ano-novo. Pior é que é uma descrença antiga. Juro que eu gostaria de começar o ano com uma crônica positiva, motivadora. Pensei sobre vários assuntos para escrever, mas é difícil, após terminarmos o ano com uma nova sacanagem: o aumento de salário dos deputados e o seu efeito cascata. E, se só isto não bastasse, tenho de aguentar as despedidas e o teatro de quem se vai. Só pra não passar batido, ainda vejo aqui no nosso quintal a união de dois blocos políticos antagônicos que se juntaram para eleger um dito inimigo do prefeito, presidente da Câmara de Vereadores. Será que agora serão amigos? Passa ano, entra ano e nada muda. Continuo me sentindo um “trouxa”.

Pensei no Chico do Ernesto, que nunca vi dormir no dia 31 de dezembro após as dez da noite, aliás, como fazia todos os dias. “Sono recuperador é o de antes da meia-noite e, pra mim, todo dia que acordo é um dia novo e nele começa outro ano”, dizia. Frase esta que sempre me levou a pensar que essa história de comemorar ano novo é uma invencionice! É uma comercialização da esperança. Uma medida ilusória da passagem do tempo.

A gente, de tanto ver as pessoas reclamarem que estão cansadas e que se o ano não acabasse morreriam, até tem a tendência de acreditar. Mas o que acontece? Neguinho passa a virada, enche a cara de Sidra, devora o coitado do porco, só porque fuça pra frente, come lentilha, pula onda e joga flor no mar. Na manhã seguinte, dia primeiro, acorda com gosto de cabo de guarda-chuva na boca, mas acreditando no milagre da renovação, já se sentindo descansado e acreditando que dali para adiante tudo vai ser diferente. Mero engano.

Tudo que existe em dezembro deste ano continuará existindo em janeiro do próximo. O sistema público de saúde, de educação, de segurança e os maus políticos continuarão os mesmos. Bom, sai o Lula e entra a Dilma. Quem sabe, mude. Aqui na nossa paróquia, os vereadores, “experts”, continuarão discutindo o planejamento urbano, rua por rua, o aumento da passagem de ônibus e o prefeito inaugurando calçadas e semáforos. E a minha descrença continua. Como diria minha amiga Cris: “ÓhmoDeus! Será que isto muda um dia?”.

Feliz Natal


Há 50 anos, nossas mães diziam: “Se vocês não estudarem, não passarão de ano e não ganharão presentes do Papai Noel”. Aquele jeito de nos pressionar dava-nos pavor do bom velhinho. Mas, como sempre, passávamos de ano na escola, dias antes do Natal estávamos lá ajudando a mãe a enfeitar o pinheirinho. Árvore de verdade enfeitada com bolas de vidro vermelhas, velinhas coloridas, fios de prata e algodão.

Na casa dos meus amigos, vizinhos ali do Bucarein, não era diferente. A rua Gastão Vidigal congregava seus moradores e a gente se sentia uma família. Seu Schroeder e a dona Olga, pais do Osvaldo, casado com a Alvacir, pais do Sergio e da Liane e tios do Cláudio; seu Renato Garcia e dona Florita, pais da Zilda, Ica, Nato, Tota, Babi, Zildemar e Zilmar; dona Laura, avó da Cassia e do Ed, filhos do Nesinho e da Maria Laura; seu Ulisses e dona Zizi, pais da Maeve, Betinha, Carmem Lucia e Neusa, que moravam ao lado do seu Pacheco e da dona Neia, pais do Calinho “Xuxu” e do Zé Marcos, primos do Sergio Murilo e do Claudio.

No outro lado da rua, tinha o Pinga e a Heleida, filhos do Zilo e da Zulma, o Reinoldo e a Zenaide, pais do Lori e da Marcia. O Gê, a Maria do Carmo e o Odil, filhos da Mariazinha e do Marinheiro. O seu João Calafate e a dona Balduina (que quando vejo um fogão de lenha sempre me vem à lembrança), pais da Juraci, esposa do Volvenaer, pais do Silvio, Quika, Maria, Tinho e Dido. Seu Basílio e a dona Alzira, pais do Ninho, Marli e Marisa; seu Pedro dos Passos e da Dona Nair, pais do Leo e da Lair. E nós, filhos do Chico do Ernesto e da Nilza: Xande, Arino, Anselmo e Ariosto.

Bons tempos em que os vizinhos se conheciam e se preocupavam uns com os outros. Diferentemente dos dias de hoje, o espírito natalino imperava na vizinhança durante o ano todo e aflorava nesta época do ano com mais intensidade. Há muito não vejo muitas destas pessoas que me ajudaram a crescer e nem sinto o espírito de vizinhança. Alguns já partiram para o oriente eterno, outros estão por aqui, mas todos, onde estiverem, espero que se lembrem daqueles bons tempos. A todos um Feliz Natal!

*Com a ajuda de Orestes João dos Passos (Tinho)