quarta-feira, 8 de abril de 2015

Apelidos

Durante décadas, o bar (Plácido Olímpio esquina com Procópio Gomes) serviu de concentração para os estivadores, que trabalhavam no Porto do Bucarein, na antiga Joinville, carregando as “chatas” com tábuas de pinheiro, que viajariam mundo afora. No fim do dia, vinham para o bar, para descansar da lida pesada, beber uns “gorós” e conversar. O Chico do Ernesto, dono do bar, era o maestro, com facilidade incrível para apelidar os frequentadores. Talvez hoje, nestes tempos do “politicamente correto”, fosse condenado por bullying. Antigamente, era comum as pessoas terem apelidos. Alguns se chateavam, outros adotavam, mas, sinceramente, não conheço ninguém que tenha ficado sequelado por este motivo. Naquele tempo, era difícil alguém escapar de ser apelidado e pegava mais facilmente em quem se irritava. O comércio era de secos e molhados, o que quer dizer que se vendia de tudo. Mantimentos de um lado e bebidas do outro. “Seu Cico, meu pai quer um quilo de milo telo, pras galinhas”. Pronto, apelidado: Milo Telo! Os filhos não escaparam: Pé de Valsa, Gordurinha, Pirulito e Carijó. E os amigos destes também não: Pinga, Coronel, Vela, Cepa, Grilo, Lilo Boca d’Água, Pedro Avião, Pirão e por aí afora. Apelido virou designação, geralmente para identificar uma pessoa, de acordo com certa característica, positiva ou negativa, que se destaque nesta. Quem conheceu o Chico e sua boa alma sabe que o objetivo não era ofender ou humilhar. Era algo que vinha dele. Vangloriava-se de ser conhecido como “Chico do Ernesto”. Apelido da vida toda. Defendia que todos deveriam ter o seu e registrados em cartório. “O apelido traça o perfil do seu dono, diferentemente dos nomes que são escolhidos pelos pais”, dizia. É por isso que eles se fixam e se tornam maiores, a ponto de ignorarmos os nomes verdadeiros. Outro dia, olhava meu álbum de formatura na engenharia e citava: “O Bico, o Pão com Molho, o Baiano, o Cacá”, e cadê que eu lembrava dos nomes deles? E, na real, entendo que naquele tempo nós éramos mais tranquilos, mais amigos e mais educados. Hoje, penso em como éramos e, só por isto, entendo que valeu a pena ter tido um apelido.